ADIR - L'altro diritto

ISSN 1827-0565

4. A segurança pública na Paraíba e o "pacto nacional pela democratização"

Lúcia Lemos Dias, 2011

Introdução

Este capítulo focaliza a adesão à nova concepção e às novas práticas de Segurança Pública na Paraíba, nacional e estadualmente definidas nos Planos que propõem uma nova política para esse setor. Visa-se, aqui, identificar os fatores que tendem a bloquear o processo de mudança dessa política, sobretudo no que diz respeito aos novos modos de pensar e fazer, inspirados na ótica dos Direitos Humanos tomados como substância do processo de democratização da Segurança Pública.

Com esse intuito, parte-se de uma análise sucinta da Constituição do Estado da Paraíba assim como das relações estabelecidas entre Estado e sociedade paraibana, por serem considerados esses elementos as balizas do processo de mudança de uma política pública no âmbito estadual. Aproximando-se mais da proposta específica deste estudo, analisa-se o processo de inserção da temática Direitos Humanos na sociedade paraibana assim como nos órgãos da Segurança Pública, além de sinalizar a intenção de construir-se uma nova relação entre a polícia e a sociedade.

Tendo como referência um processo político e pedagógico esboçado e necessário à construção de uma nova forma de pensar e fazer Segurança Pública, analisa-se a vinculação orgânica dos funcionários da segurança, mais precisamente dos policiais militares, para com a nova política para o setor.

A seguir, elegendo-se a análise da experiência concreta do Policiamento Comunitário como política preventiva e considerada como prática democratizante em Segurança Pública, tenta-se detectar os entraves à sua implementação, tanto no campo institucional quanto na percepção dos policiais militares sobre a nova cultura que configura a proposta democratizante da Segurança Pública.

Destarte, a partir da insuficiência das mudanças do contexto político e societário para garantir o processo de mudança da Segurança Pública, insuficiência esta percebida através dos fatos concretos relatados e analisados, este capítulo detém-se nos aspectos culturais, considerando-os como especialmente relevantes para o necessário rito de passagem do velho para o novo modelo de Segurança Pública. A reflexão concentra-se, então, na necessidade e nos modos possíveis de promover-se uma reelaboração mental dos significados de Segurança Pública, Democracia e Direitos Humanos e policiamento por parte dos agentes públicos, indispensáveis implementadores de qualquer política pública.

Os policiais entrevistados, que têm voz neste capítulo, foram selecionados usando-se como critério de escolha o fato de que tiveram alguma aproximação com a temática Direitos Humanos e/ou práticas de cunho democratizante - seja através do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, como representantes da Polícia Militar, nesse órgão, seja por terem participado de tentativas de implantação de Polícia Comunitária ou, ainda, por integrarem o Movimento Cidadania e Segurança. Tal perfil possibilitou o estabelecimento do diálogo entre a pesquisadora e os sujeitos da pesquisa, facilitando a disponibilidade e espontaneidade dos policiais em contribuir com a identificação das dificuldades vivenciadas no processo de mudança da política.

Não obstante, o fato desses policiais, na sua maioria, expressarem o desejo de mudança da política de Segurança Pública, não perderam características marcantes da cultura autoritária, principalmente as vinculadas à doutrina militar. Por essa razão, acabam por revelar um sentimento de ambigüidade entre o novo e o velho modelo de Segurança Pública, sobretudo quando o discurso perpassa questões relacionadas à prática profissional e à instituição a que pertencem. Isto reforça a idéia de que os elementos culturais, avessos a uma política pública democrática, introjetados no modo de sentir, pensar e agir dos policiais encontram-se fortemente arraigados, o que faz crer que não seja tão fácil suplantar a cultura antidemocrática pela cultura dos Direitos Humanos, conforme desejado por alguns setores da sociedade.

4.1. Aspectos político-jurídicos e a adesão do Governo da Paraíba ao SUSP

4.1.1. Estrutura jurídica e institucional da Segurança na Paraíba: características e ambigüidades

Em termos jurídicos, na Paraíba, a Segurança Pública rege-se por normas elaboradas em consonância à ordem jurídica nacional, ambíguas e insuficientes enquanto base de sustentação legal para o processo de democratização da Segurança Pública, em consonância ao que propõe a nova política nacional de segurança. Mesmo assim, o fracasso do processo político de mudança da Segurança Pública, neste Estado, com vistas à sua adequação ao Estado Democrático de Direito, a partir do SUSP, não pode ser atribuído unicamente à falta de amparo legal.

Promulgada a 05 de outubro de 1989, ou seja, um ano após a Promulgação da Constituição Federal Brasileira -CF, a Constituição do Estado da Paraíba -CEPB reserva o Capítulo IV à Segurança Pública. Esse capítulo, a exemplo da CF, define segurança como dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, com o objetivo de preservação da ordem pública, da incolumidade da pessoa e do patrimônio. Indo além, acrescenta como objetivo o "asseguramento da liberdade e garantias individuais" (PARAIBA, CEPB, 2005).

Constata-se, portanto, que a Constituição paraibana traz a noção de Segurança Pública apoiada na visão tradicional dos Direitos Humanos, ou seja, diferentemente da noção de Segurança Pública sinalizada pelo SUSP, que restringe o alcance da Segurança Pública aos direitos civis.

As Polícias Militar e a Civil foram definidas, na Constituição paraibana, como órgãos responsáveis pela execução da política estadual de segurança que, de forma autônoma, embora em harmonia com outros órgãos definidos em lei, devem assessorar o Governo nesta matéria. Conforme estabelecido no § 2º, do art. 42, estes órgãos "permanentes de Segurança Pública reger-se-ão pelos princípios da hierarquia e da disciplina, tendo seus chefes direito a tratamento honorífico e protocolar, sendo nomeados em comissão pelo Governador do Estado" (PARAÍBA, CEPB, 2005, p. 68 -69).

No art. 43, a Constituição estadual, ao assimilar as determinações da legislação superior, delega ao Governador do Estado a responsabilidade de "coordenação das ações de Segurança Pública, bem como o estabelecimento da política de Defesa Social, assessorado pelo Conselho Estadual de Defesa Social" (PARAÍBA, CEPB, 2005, p. 69).

Embora a distinção entre Segurança Pública e Defesa Social não seja claramente explicitada, fato importante a enfatizar é o de que o art. 43 indica um avanço em termos democráticos, ao fazer referência a um órgão considerado instrumento de socialização de práticas políticas institucionais, no caso específico, o Conselho Estadual de Defesa Social. Determina-se que será presidido pelo Governador e que sua composição se dará consoante à definição em lei. A competência desse Conselho, segundo os incisos do § 1º, constante no art. 43, consiste em:

I - a elaboração da política de Segurança Pública; II - o estabelecimento de diretrizes, normas gerais e preceitos que possibilitem sincronia e integração de ações com vista à preservação da ordem pública; III - o acompanhamento sistemático da situação de Segurança Pública em todo o Estado (PARAIBA, CEPB, 2005, p. 69).

Observa-se que a intenção do constituinte paraibano, ao incluir a defesa das garantias individuais na concepção de Segurança Pública e ao atribuir a um órgão colegiado a responsabilidade pelo desenho e a sistematização da política de segurança no Estado, indica uma preocupação não vista por parte dos constituintes nacionais que optaram por tratar a Segurança Pública de forma abstrata e distante do contexto democrático.

A Constituição estadual também atribui responsabilidades específicas, segundo se observa do art. 44, às polícias estaduais, órgãos responsáveis pela execução da política de Segurança Pública no Estado. À Polícia Civil, segundo termo da própria Constituição (2005, p. 69-70), "instituída por lei como órgão de preservação da ordem jurídica, auxiliar direta e imediata jurisdicional do Estado, estruturada em carreira, incumbe, além de outras atribuições definidas em lei e ressalvada a competência da União", compete:

I - prevenir e exercer as funções de polícia judiciária; II - prevenir e reprimir a criminalidade, bem como apurar as infrações penais, exceto as militares; III, realizar as perícias criminais e médico-legais e a identificação civil e criminal; IV - operacionalizar as ações ligadas à Segurança Pública do Estado, no que for de sua competência (PARAÍBA, CEPB, 2005, p. 70).

A Polícia Militar da Paraíba, em consonância à Carta Magna, foi reconhecida pela Constituição Paraibana como "força auxiliar e reserva do Exército, organizada com base na hierarquia e na disciplina". A esse órgão policial compete, segundo se observa do art. 48:

I - a polícia ostensiva em todas as suas formas; II - as ações de preservação da ordem pública; III - as ações de prevenção e combate a incêndio, buscas e salvamento; IV - as atividades de defesa civil; V - as atividades do Gabinete Militar do Governador do Estado, do Vice-Governador, as de assessorias militares e de assistência às Presidências dos Poderes Legislativo e Judiciário e à Prefeitura da Capital do Estado (PARAÍBA, CEPB, 2005, p. 71).

Dentre as amplas competências delegadas à Polícia Militar da Paraíba não foi incluída, explicitamente, a ação de prevenção da violência e do crime, embora lhe tenha sido reservada a ostensividade "em todas as suas formas". Estranhamente, a ação preventiva foi explicitada como atribuição da Polícia Civil, que tem a responsabilidade investigativa, não lhe sendo, logicamente, aconselhável a ostensividade característica e necessária às práticas preventivas em Segurança Pública.

Já a Constituição Federal não menciona a prática preventiva, referindo-se apenas à ostensividade reservada às Polícias Militares. Na Paraíba, entretanto, é fato que algumas ações de cunho preventivo, ainda que apenas incipientes, têm sido levadas a efeito pela Polícia Militar.

Convém ainda destacar que, embora na estrutura e na prática a função propriamente policial seja claramente diferenciada da função do Corpo de Bombeiros, na Constituição paraibana essa distinção não é perceptível. Apesar das atividades de Corpo de Bombeiros serem de natureza e escopo essencialmente civis, esse corpo e suas atribuições específicas sequer foram citados nesta Constituição, o que representa uma lacuna considerável.

A Lei 8.444, de 28 de dezembro de 2007, que dispõe "sobre a organização básica do Corpo de Bombeiros Militar da Paraíba" não teve a preocupação de torná-lo um órgão de defesa civil, mantendo-o estruturado em conformidade com a PMPB, segundo os termos da Constituição paraibana. Nesse sentido, afirma o seu art. 1º:

"O Corpo de Bombeiros Militar da Paraíba, considerada força auxiliar e reserva do Exército Brasileiro, organizado com base na hierarquia e na disciplina, em conformidade com as disposições da Constituição do Estado da Paraíba, destina-se a executar e a coordenar as atividades de Bombeiro militar no Estado da Paraíba." (PARAÍBA, 2007)

Segundo a mencionada lei, as características de órgão militar foram mantidas no Corpo de Bombeiros, da Paraíba, não apenas através da denominação e da sua estruturação; consoante o art. 8º, o órgão "reger-se-á pelas Leis e regulamentos que são aplicados a Polícia Militar".

Em outros termos, vale dizer que o avanço que se percebe a partir da nova lei que dispõe sobre o Corpo de Bombeiros, da Paraíba, restringe-se a sua autonomia administrativa em relação à Polícia Militar, com a criação de comando exclusivo, mas não perde suas referências e características de instituição militar, embora suas atividades sejam consideradas de natureza civil.

Retornando o foco da análise para a Constituição da Paraíba, em vigência, merece destaque, ainda, o Parágrafo Único do art. 48, com relação ao tratamento a ser dispensado ao oficial que vier a comandar a Polícia Militar da Paraíba, cabendo-lhe o "título e posicionamento de Secretário de Estado" (PARAÍBA, CEPB, 2005, p.71). Esta determinação significa, na realidade, a independência desse órgão de Segurança Pública em relação à Secretária de Segurança Pública, instituição do governo civil responsável pela gestão da política estadual na área. De acordo com o art. 42, supra mencionado, ambas as polícias estão sob gestão independente e específica para cada uma delas, representando a garantia de autonomia e separação no campo da prática. Embora a vinculação às Forças Armadas seja exclusiva da Polícia Militar, os princípios de hierarquia e de disciplina conformam também a Polícia Civil.

Um fato a ser observado com relação a essa estruturação baseada na autonomia dos órgãos da segurança Pública do Estado, diz respeito ao entrave que ela chega a representar para o estabelecimento de coordenação única da política de segurança pelo ocupante do cargo de Secretário de Segurança Pública, conforme estabelecido pelo Sistema Único de Segurança Pública.

A Constituição Paraibana não define critérios para o estabelecimento da política de segurança do Estado, demonstrando como preocupação primordial a salvaguarda das garantias, ou melhor, do poder político dos órgãos executores dessa política. Assim sendo, o Poder Executivo Estadual tem ampla liberdade para definir a política de Segurança Pública a ser implementada e também, de certo modo, para configurar seus órgãos executores.

A Segurança Pública, na Paraíba, demonstra incongruências para com a nova ordem democrática, uma vez que suas instituições permanecem inspiradas no autoritarismo político, fortalecido pela última ditadura, além de que, mesmo após a incorporação do Governo Estadual ao SUSP, suas práticas permanecem amalgamadas pelo persistente autoritarismo social difuso na sociedade, fundamentado por uma cultura hierarquizante e discriminatória, já assinalada no cap. II.

4.1.2. A atuação da Sociedade Civil da Paraíba nas últimas décadas

Quanto à Sociedade Civil ou, melhor dizendo, no que diz respeito à relação estabelecida entre o Estado e a sociedade, cabe lembrar que a sociedade paraibana, como as demais sociedades capitalistas, não deixa de ser permeada por contradições sociais e interesses conflitantes entre as classes sociais que vão influir no poder instituído, no bojo da disputa pela hegemonia do poder político.

A história política recente da Paraíba tem sido marcada pela permanência do predomínio de oligarquias políticas, representantes das famílias remanescentes do coronelismo (1). As práticas políticas oligárquicas tendem a ser orientadas pelo clientelismo (2), como também pela ação de cooptação dos movimentos sociais.

Os processos eleitorais, neste contexto, são mediatizados pela troca de votos, através da "concessão" de benefícios materiais, simbolizada pela satisfação do desejo do eleitor segundo Blondel (1994). A idéia de doação e favor é a estratégia usada por certos grupos para manter-se no poder. O clientelismo político tem sido, preferencialmente, utilizado como estratégia de campanha para obtenção dos votos dos pobres, mas a política de barganha alcança também os ricos, que garantem privilégios e vantagens com a ocupação de cargos públicos para os quais são indicados pelos políticos "amigos", detentores do poder.

A falta de bibliografia sob a ótica dos protagonistas sociais, opositores do poder econômico e político instituído, na Paraíba, por vezes leva a crer que a característica marcante desse Estado foi a de manter-se inspirado em princípios autoritários, nutrindo a cisão entre este e a sociedade.

Mas, como advertem Nunes et al (2008), o fato de o Estado paraibano apresentar como característica marcante a sua supremacia sobre a Sociedade Civil, não significa que esta tenha sido amorfa ao longo da história da Paraíba. Vale lembrar que a Sociedade Civil paraibana, já nas décadas dos 1950 e 1960, destacou-se no Brasil como cenário de lutas de trabalhadores rurais, travadas pelas Ligas Camponesas, contra a relação de exploração estabelecida pelos latifundiários, no período que antecedeu à ditadura militar, além de, no mesmo período, contar com a presença de um movimento estudantil ativo no espaço público.

Registre-se também a expressiva atuação de importantes Movimentos Sociais no cenário político paraibano, durante o processo de luta e resistência contra o regime militar. A partir dos anos 1970, constata-se a crescente articulação dos vários Movimentos Sociais rurais, sindicais, estudantis, feminista, além da adesão da Ordem dos Advogados do Brasil - seção da Paraíba (OAB-PB) e da Associação Paraibana de Imprensa - API, em defesa do restabelecimento do regime democrático (NUNES, et. al., 2008). Nesse contexto, destacou-se sobremaneira a relevante atuação da Igreja Católica, principalmente a partir de 1975, sob a liderança do Arcebispo Dom José Maria Pires, na Capital e de seu auxiliar Dom Marcelo Carvalheira, instalado em Guarabira em 1976, grandes incentivadores da luta em defesa dos direitos dos trabalhadores. Registre-se, portanto, o ressurgimento já nos anos 1970, com o emblemático conflito de terras em Alagamar e o rápido crescimento, nos anos 1980, das lutas dos trabalhadores rurais nos vários municípios, seja em torno da posse da terra, seja em defesa de direitos trabalhistas, principalmente por parte dos trabalhadores vinculados à indústria açucareira, que realizaram sua primeira greve geral em 1984. Cabe aqui destacar o papel significativo da líder sindical Margarida Maria Alves, assassinada, em 1983, a mando de representantes da oligarquia rural e açucareira do Município de Alagoa Grande.

Nos anos mil novecentos e oitenta registram-se também a emergência e a consolidação de relevantes órgãos de defesa da cidadania, dentre eles, vinculados inicialmente à Arquidiocese e, em seguida, à recém-criada diocese de Guarabira, o Serviço de Educação Popular - SEDUP, o Centro de Direitos Humanos e a Comissão Pastoral da Terra - CPT local, além do Movimento das Mulheres Trabalhadoras do Brejo e do Movimento de Renovação Sindical, abrangendo todos os municípios vizinhos. Na Capital do Estado foram criados o Centro de Defesa dos Direitos Humanos, Assessoria e Educação Popular, a Associação Santos Dias, a Sociedade de Assessoria aos Movimentos Populares e Sindical -SAMOPS, o Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua (ZENAIDE, 2001, p.122).

Diversos setores da Sociedade Civil contavam com a assessoria de professores universitários que associavam sua prática científica e política à intervenção social. Nesta perspectiva, na Universidade Federal da Paraíba - UFPB, grupos de professores e funcionários, dedicados à extensão universitária, direcionaram sua atividade para a assessoria e apoio aos movimentos e entidades da Sociedade Civil.

Os anos mil novecentos e noventa tiveram como característica marcante a criação de Organizações não Governamentais - ONGs, Comissões de Direitos Humanos e Conselhos de Defesa da Cidadania. Esses dois últimos configurados como órgãos da "nova esfera pública da cidadania" (3) segundo Lyra (1996). Neste contexto, quando já se havia instituído formalmente o Estado Democrático de Direito, foi criada a Comissão de Direitos Humanos da UFPB (4), tendo como objetivo sensibilizar a própria Universidade e a sociedade paraibana para importância do respeito e da garantia dos Direitos Humanos (DIAS; TOSI, 1996).

O referido órgão, constituído de docentes, servidores e discentes da comunidade universitária, priorizou, inicialmente, visitas aos estabelecimentos prisionais, em virtude das freqüentes denúncias de torturas e maus tratos aos detentos, além de promover ciclos de palestras e debates relacionados aos temas Democracia e Direitos Humanos, abertos à sociedade. Nesse momento, a temática Direitos Humanos não tinha penetração na sociedade em geral, nem mesmo nos grupos sociais e entidades da Sociedade Civil.

Do mesmo modo, a temática relacionada à Segurança Pública, concebida como política pública, não tinha alcance social. A Segurança Pública foi introduzida como bandeira de luta por ativistas políticos provenientes da luta contra o regime militar, no início dos anos 1990, todavia agora focalizada na violência policial que passara a ganhar visibilidade pública em decorrência da divulgação, pela mídia, de casos de violação de Direitos Humanos, praticados por policiais da Paraíba.

4.1.3. Tentativas de aproximação da Segurança Pública aos temas dos Direitos Humanos e da participação democrática na Paraíba

Diante da falta de um órgão que fomentasse a articulação dos diferentes atores da Sociedade Civil com vista ao controle social do Estado, a Comissão de Direitos Humanos da UFPB, em parceria com a Procuradoria da República, em 1992, articulou a criação de um órgão de caráter público, em nível estadual, voltado para a defesa dos Direitos Humanos. Denominado de Conselho Estadual de Defesa dos Direitos do Homem e do Cidadão (5) -CEDDHC, o referido órgão tinha como papel primordial "enraizar e disseminar uma mentalidade democrática no Estado da Paraíba" (LYRA, 1996, p. 49).

A lei, que criou o Conselho, permitiu ampla participação da Sociedade Civil, como também "de órgãos públicos encarregados da defesa e da promoção da cidadania, como o Ministério Público Estadual e Federal, a Corregedoria de Justiça, a Procuradoria Geral da Defensoria Pública e as Secretarias de Justiça e de Segurança Pública do governo" (LYRA, 1996, p. 36). Segundo Lyra (1996), diante da relevância da participação dos órgãos públicos nesse Conselho, a Polícia Militar do Estado foi convidada a integrá-lo. Deste modo, as duas instituições públicas de caráter coercitivo, responsáveis pela implementação da política de Segurança Pública no Estado, Polícia Militar e Polícia Civil, passaram a ter assento no órgão.

Não se limitando à atividade de fiscalização e controle, mas também voltado para a prática educativa, o CEDDHC promoveu, em parceria com a Comissão de Direitos Humanos da UFPB, em 1992, um curso de extensão sobre Direitos Humanos para Delegados da Polícia Civil, conferindo à polícia da Paraíba o mérito do pioneirismo na iniciativa de educação em Direitos Humanos. No ano seguinte, foi realizado um segundo curso, com estrutura e conteúdo similar, para os oficiais da Polícia Militar.

Ciente de que a superação das práticas de violação dos Direitos Humanos depende do envolvimento da sociedade, o Conselho adotou uma campanha contra a violência policial e pela tipificação da tortura como crime. Como afirma Lyra (1996, p. 51), tratava-se de uma "luta difícil, por causa da relativa indiferença de entidades da sociedade face ao tema, pelo desinteresse e falta de responsabilidade da maioria dos membros do Congresso Nacional".

Para Lyra (1996), a violência policial foi tolerada pela sociedade paraibana durante anos, o que demonstra a debilidade da nossa democracia assim como a fragilidade da Sociedade Civil. Sugere o mesmo autor que um dos grandes entraves ao avanço das lutas democráticas é a priorização dos interesses corporativistas por parte dos órgãos e grupos sociais. Neste sentido, o autor alega que:

Não pode haver democracia enquanto nós apenas estejamos preocupados com nosso sindicato, em botar mais dinheiro no bolso, por mais legítima que possa ser esta aspiração. Não pode haver democracia enquanto a Universidade estiver isolada da sua torre de marfim, pretendendo aposentadorias precoces e querendo se eximir de qualquer controle social na sua avaliação; enquanto a Polícia Militar desenvolver um comportamento corporativo; enquanto a OAB não admitir críticas ao seu estatuto; enquanto o Poder Judiciário submeter à execração pública quem luta pelo seu controle externo. Nós temos que vencer estes condicionamentos corporativos, caso contrário não teremos a democracia, teremos uma brincadeira. Nós não podemos construir uma democracia enquanto não tentarmos nos voltar para a formulação de projetos e de uma visão da transformação da sociedade que se vise, predominantemente, o interesse público. Isso é possível se tivermos coragem de enfrentar as nossas próprias mazelas (LYRA, 1996, p. 53).

Destaca-se, portanto, o relevante papel de articulação política exercido pelo referido Conselho ao promover a aproximação entre Estado e sociedade, sobretudo entre os órgãos da área da Segurança Pública e entidades da Sociedade Civil, fomentando, ainda, a articulação entre os diversos setores da Sociedade Civil e dos setores públicos entre si, tendo como substrato a defesa dos Direitos Humanos.

Uma vez iniciado o processo, em certas circunstâncias, os órgãos de segurança apareciam como parceiros da Sociedade Civil e, em outros momentos, tornavam-se alvos de denúncias da sociedade, em virtude da persistência de práticas de violação de Direitos Humanos. Assim, instaurou-se um processo não linear de construção de uma nova relação entre sociedade e polícia, marcada por ambigüidades, avanços e recuos. O fato relevante, entretanto, é que dentro dos limites do possível em cada etapa, foi instaurado um processo de busca da aproximação até então inexistente entre o Estado e a sociedade, tendo em vista a garantia do direito de todos à segurança.

Como mostram Zenaide e Dias (2006), a UFPB tem exercido um relevante papel na construção de uma cultura de promoção e de defesa dos direitos humanos, na sociedade paraibana e juntos aos órgãos públicos, ao colocar-se:

(...) à disposição de processos participativos, dos movimentos sociais e dos órgãos da esfera pública da cidadania, contribuindo para a capacitação e formação de sujeitos políticos capazes de exercitar, na luta profissional, social e institucional, a conquista dos direitos civis, políticos, sociais, econômicos e culturais (ZENAIDE; DIAS, 2006, p. 55).

Ao fazer a opção por uma abordagem interdisciplinar dos direitos humanos a Comissão de Direitos Humanos conseguiu sensibilizar e mobilizar diferentes áreas do conhecimento, propiciando a articulação de saberes, ao mesmo tempo em que permitiu envolvimento de diversos setores da UFPB com a temática direitos humanos (ZENAIDE; DIAS, 2006).

Isso não significa dizer que na comunidade acadêmica, assim como na sociedade paraibana, os Direitos Humanos também não enfrentem resistências e preconceitos. No entanto, a passos lentos, a partir da extensão universitária, o tema direitos humanos foi conquistando alguns espaços na Universidade Federal da Paraíba, culminando com a realização de cursos de pós-graduação, lato sensu, desde 1995. Motivada pelo edital da Fundação Ford e com o apoio da Comissão de Direitos Humanos, no ano de 2005, houve a introdução da temática Direitos Humanos no Curso de Mestrado em Direito do Centro de Ciências Jurídicas, através da criação da área de concentração em direitos humanos. Além da UFPB, nesse momento, foi introduzida, a área de concentração em direitos humanos nas pós-graduações em Direito da Universidade de São Paulo e da Universidade Federal do Pará.

A característica marcante da prática político-pedagógica em direitos humanos, iniciada na UFPB em 1990, através da Comissão de Direitos Humanos e fortalecida com a criação do Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos - NCDH (6), no ano de 2007, tem sido a garantia da interdisciplinaridade. A articulação dos vários conhecimentos nessa área tem permitido desconstruir leituras reducionistas acerca do tema, ao mesmo tempo em que vem desfazendo entendimentos hegemônicos quanto à especificidade jurídica dos direitos humanos. Outro aspecto relevante dessa prática a ser destacado diz respeito à articulação das áreas de intervenção da Universidade, chegando a demonstrar, de forma efetiva, que há possibilidade de construção de práticas acadêmicas balizadas no tripé ensino-pesquisa e extensão.

Nesta perspectiva, entre 1997 e 2001, foram intensificadas as práticas político-pedagógicas de extensão universitária relacionadas à temática Segurança Pública e Direitos Humanos, através da Comissão de Direitos Humanos e da Pró-Reitoria de Extensão Comunitária da UFPB, em parceria com o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, com o apoio da Polícia Militar da Paraíba.

Com intuito de atender uma crescente demanda foram realizadas diversas atividades em forma de assessorias, seminários temáticos e cursos de extensão, voltados à questão da interdependência entre Segurança Pública e Direitos Humanos, enfatizando-se a necessidade de ampliação da política de Segurança Pública no campo da prevenção, como também a importância da participação popular. Os conteúdos abordados fundamentam-se prioritariamente, no tema de Estado Democrático de Direito associado à defesa e garantia dos Direitos Humanos e à cidadania democrática.

Neste período, a filosofia de polícia comunitária, introduzida nas práticas de extensão universitária, contribuiu para uma maior aproximação entre polícia e sociedade. Os cursos de extensão Polícia Comunitária e Polícia como Protetora dos Direitos Humanos, ao congregarem públicos diversificados da Sociedade Civil e de órgãos públicos diversos, além de policiais militares e civis, foram contribuindo para a diminuição da resistência e do preconceito mútuo, além de despertar para a importância de um diálogo ampliado sobre a política de Segurança Pública entre polícia e sociedade.

Alguns elementos podem ser considerados favoráveis à intensificação das ações político-pedagógicas em segurança pública e direitos humanos. Dentre outros, podem ser destacados: a) o fortalecimento da intervenção em Direitos Humanos na UFPB, com a criação do Programa Segurança, Cidadania e Direitos Humanos, em 1997, na Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos comunitários; b) a conjuntura favorável à realização de parceria com o Centro de Ensino da Polícia Militar da Paraíba, sobretudo influenciado pelo Programa Nacional de Direitos, que introduziu o tema direitos humanos nos cursos de formação e capacitação de policiais, e, propôs a implantação de polícia comunitária; c) a disponibilidade de recursos do Programa de Qualificação e Geração de Emprego e Renda, do Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT, para extensão universitária; d) o fortalecimento do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, sob a Presidência da professora universitária, Maria de Nazaré Tavares Zenaide, vinculada a CDH\UFPB, que possibilitou a articulação e o intercâmbio com vários órgãos governamentais e não governamentais, em nível local e nacional, vinculados à área de segurança pública e\ou direitos humanos. Destaca-se, ainda, que no final dos anos 1990, verificou-se o crescimento da violência e da criminalidade em João Pessoa e, de outro lado, a precariedade dos órgãos de segurança pública, fazendo com que lideranças de grupos comunitários procurassem a Universidade em busca de ações em torno desse problema.

As atividades de extensão universitária relacionadas à segurança pública e aos direitos humanos foram estimulando, nos membros da sociedade e dos órgãos públicos, o envolvimento com a temática Segurança Pública, inclusive despertando-os para a necessidade de prática de caráter democrático, de participação direta. Dois fatos concretos relacionados a um dos cursos de Polícia Comunitária são exemplares para essa afirmativa. Os alunos, ao serem informados do contingenciamento de recursos financeiros provenientes de convênio celebrado entre a UFPB e a Secretaria de Trabalho e Ação social do Estado, provenientes do Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT, que viabilizariam a realização do curso, organizaram-se e foram diretamente ao Secretário de Estado, - responsável pela administração do fundo na Paraíba -, reivindicar que não houvesse corte dos recursos destinados ao curso do qual participavam. Outra prática dos alunos (membros da sociedade e policiais) do curso de polícia comunitária, caracterizada como exercício democrático na área de Segurança Pública, até então desconhecida na Paraíba, foi a entrega de documento, elaborado no decorrer das aulas, ao governador contendo reivindicações relacionadas às mudanças democratizantes da Segurança Pública no estado.

Os cursos relativos ao policiamento comunitário tiveram quebra de continuidade a partir do ano 2002, momento em que os recursos do FAT, vinculados ao programa de qualificação dos trabalhadores, deixaram de ser repassados pela Secretaria Estadual de Trabalho e Ação Social à Universidade.

Dentro da mesma proposta experimentada pelos cursos de policiamento comunitário, em decorrência de convênio com o Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares - GAJOP (7) (2001 - 2002), foi realizado o curso de extensão "A Polícia como Protetora dos Direitos Humanos", em cinco municípios da Paraíba, envolvendo membros da sociedade civil, órgãos públicos diversos, além de policiais civis e militares.

Essas experiências foram significativas, principalmente por fomentar, junto aos representantes da sociedade, a expectativa de atuação como partícipes na política de prevenção em Segurança Pública. À medida que se ampliavam essas ações com a participação conjunta da sociedade e das polícias, difundia-se a idéia de que Segurança Pública não se constitui apenas em "coisa de polícia", segundo expressão de Ricardo Balestreri (2003).

Além do Programa Nacional de Direitos Humanos, criado em 1996, o primeiro Plano Nacional de Segurança Pública, criado em 2000, fomentava práticas educativas dessa natureza e o envolvimento da sociedade nas discussões relativas à segurança pública, ao destacar a participação popular. Mesmo assim, não foi dado o destaque devido para a criação de estratégias políticas por parte dos governos Fernando Henrique Cardoso, em nível federal e José Targino Maranhão, no Estado da Paraíba, tendo em vista proporcionar maior envolvimento da sociedade civil paraibana com a política de segurança pública.

No início de 2003, vivia-se numa nova conjuntura política, em que o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, identificado com os interesses dos trabalhadores, estimulava a esperança de milhões de brasileiros que dependiam do desenvolvimento de políticas sociais para o atendimento de suas necessidades básicas. Neste contexto favorável a uma nova relação entre Estado e sociedade, os grupos sociais e entidades de Direitos Humanos acreditavam na possibilidade de medidas inovadoras para responder ao problema da Segurança Pública. Por parte do novo Governo Federal expressava-se a disposição de fomentar o exercício democrático nessa área, nunca antes vista como espaço da cidadania, gerando mais esperanças.

A nova política adotada pelo Governo Federal, através do SUSP, chega aos estados brasileiros em 2003, quando os dados sobre violência no Brasil elevavam-se ao montante de 51.043 homicídios, conforme se vê no gráfico do item 2.3, capitulo 2. A nova Política Nacional de Segurança Pública está, portanto, relacionada ao contexto de crise da Segurança Pública, em âmbito nacional, representando uma resposta à pressão da sociedade por uma política alternativa, enquanto se comprovava que o velho modelo não conseguia responder à complexidade dos problemas, o que se refletia também na Paraíba.

Segundo tabela do Ministério da Justiça - MJ/Secretaria Nacional de Segurança Pública/SENASP, elaborada com dados fornecidos pelas Polícias Civis das capitais dos estados, João Pessoa, capital da Paraíba, em 2001, com 35,7 homicídios dolosos por 100 mil habitantes chega a ocupar, no conjunto das demais capitais brasileiras, o 8º lugar na ordem decrescente, ficando atrás das cidades de Recife (78,7), Maceió (72,9), Vitória (62,8), Porto Velho (58,7), São Paulo (49,3) e Rio de Janeiro (37,2) (OLIVEIRA, 2005, p. 102-103).

Em harmonia com a nova política do Governo Federal, Luis Inácio da Silva, o plano estadual sinaliza para a congruência das instituições e ações de Segurança Pública com o Estado Democrático de Direito. Demonstrando preocupação com a construção de uma cultura de prevenção da violência e da criminalidade, além de destacar a participação social e a otimização do uso da força, no sentido de aplicá-la com o mínimo de agressividade e o máximo de eficiência, ele elege como "princípios" (8) fundamentais, que:

1 - o estado promoverá a garantia e promoção aos Direitos Humanos de todo o cidadão paraibano, bem como a defesa do patrimônio público e privado; 2 - as atividades dos órgãos públicos de segurança terão como prioridade a prevenção; 3 -os órgãos de Segurança Pública atuarão buscando modernidade da administração pública; 4 -as ações objetivarão adotar governabilidade e transparência buscando estabelecer novas parcerias para a redução da violência e criminalidade; 5 - o profissional de Segurança Pública será visto com dignidade e respeito em todos os seus níveis, como símbolo da autoridade pública. 6 - a participação e mobilização comunitária será prioridade para a democratização da Segurança Pública no estado (PARAÍBA, PESP, 2003, p. 23 a 26).

Essas seis preocupações são convergentes com a diretriz nº 1 do PESP, que se refere ao compromisso do Governo do Estado em implementar "o Sistema Único de Segurança Pública em parceria com o Governo Federal". Esse compromisso impõe que, a partir de então, a política de segurança na Paraíba seja configurada dentro de nova perspectiva teórica e de modo diferenciado do modelo tradicional de Segurança Pública descrito, anteriormente, no Capítulo 2 deste estudo. Ou seja, o Governo da Paraíba deveria deflagrar o processo de mudança da Segurança Pública, com vistas à sua democratização, conforme determinado pelo novo Plano Nacional de Segurança Pública.

O PESP incluiu 13 programas como mecanismos de viabilização da nova política (9). Dentre esses, destacam-se aqui os programa de desenvolvimento da filosofia de polícia comunitária e os programas sociais de prevenção da violência e da criminalidade, considerados estruturantes da nova política, que dependem principalmente de uma revisão de conteúdo, objeto, objetivos e que remetem à ampliação do campo de atuação dessa política. Em outros termos, pode-se dizer que esses programas merecem destaque por representarem, de forma efetiva, orientações para mudanças das práticas sociais de Segurança Pública que poderão culminar na democratização da política de segurança, inclusive demandando o protagonismo da sociedade, claramente previsto no referido plano.

Interessa notar que na avaliação da implantação do SUSP (2003 - 2006) no país, feita pela Secretaria Nacional de Segurança Pública - SENASP, responsável pela coordenação da nova política do Governo Federal, constam apenas 25 Estados, ficando de fora a Paraíba e o Distrito Federal por não terem enviado os dados solicitados. Os dados relativos à Paraíba, constantes nesse relatório avaliativo, dizem respeito apenas às ações realizadas diretamente pela própria SENASP, comuns a todos os Estados: a gestão do conhecimento e informação criminais; Formação e Valorização Profissional; Prevenção à Violência e Criminalidade; Estruturação e Modernização da Perícia; e Ações para Redução da violência (BRASIL, MJ/SENASP, 2007, p. 187 - 188). De acordo com os dados apresentados, de forma geral, em cada item acima assinalado, os feitos foram inexpressivos, tendo em vista as dimensões da reforma pretendida pelo SUSP como se vê pelo exemplo, que citaremos aqui, das ações relativas à Prevenção à Violência e à Criminalidade realizadas por essa Secretaria no período de 2003 a 2006, no Estado da Paraíba:

Emissão de documentos de identidade para mulheres trabalhadoras rurais; Capacitação de 7 profissionais de Segurança Pública sobre prevenção, investigação e desarticulação de organizações criminosas relacionadas ao Tráfico de Seres Humanos; Repasse de recursos financeiros por meio de convênio para 2 municípios (Bayeux e João Pessoa); Realização de oficinas de prevenção prevendo [sic] público de 500 pessoas e 420 guardas municipais (BRASIL, MJ/SENASP, 2007, p. 188).

Quanto aos recursos disponibilizados pelo Fundo Nacional de Segurança Pública, no período avaliado, a Paraíba recebeu R$ 17.066.897,14, com repasses de R$ 5.500.000,00 (2003), R$ 4.422.961,40 (2004), R$ 3.388.3166,17 (2005) e R$ 3.260.819,57 (2006), representando 1,9% do total repassado ao conjunto das unidades federativas. Desses recursos repassados à Paraíba, R$ 11.607.856,22 o foram por meio de convênios; R$ 5.693.484,17 repassaram-se de forma direta, via aquisição de equipamentos; e R$ 305.556,75, foram repassados por meio de convênios com os municípios de João Pessoa e Campina Grande (BRASIL, MJ/SENASP, 2007, p. 105 e 186).

Ainda segundo os dados do mesmo documento de Avaliação do SUSP, o que há de mais concreto com relação à implantação dessa política, na Paraíba, limita-se ao repasse de recursos destinados à aquisição de equipamentos. Ações estruturantes com vistas à democratização da Segurança Pública não foram registradas, assim como não são perceptíveis aos olhos da sociedade.

A polícia continuou priorizando velhas práticas, desconhecendo a importância da ação preventiva como meio essencial para promover-se a segurança no Estado Democrático de Direito. Os grupos operacionais institucionalmente valorizados na Segurança Pública da Paraíba continuaram a ser os que priorizam as práticas de combate, cuja base teórica preserva, essencialmente, conteúdos que se associam à Doutrina de Segurança Nacional. Prioriza-se, por exemplo, o Grupo de Operações Táticas - GATE, cuja necessidade não se pode negar, mas desde que se observe o respeito aos Direitos Humanos.

4.2. Cultura antidemocrática: obstáculo ao processo de mudança na política de Segurança Pública na Paraíba

Ao adotar uma nova proposta de Segurança Pública para o Estado da Paraíba que remete, segundo termos de Cerqueira, a novos "saberes e novos fazeres", é evidente que a preocupação primeira do então governador, Cássio Cunha Lima, deveria considerar os agentes executores da política, já que o sucesso de uma nova política pública depende, principalmente, do envolvimento daqueles responsáveis pela sua implementação. Para analisar e compreender o processo de implantação e desenvolvimento dessa opção na Paraíba é, portanto, indispensável indagar por quais processos e métodos os policiais militares, responsáveis pela ação policial ostensiva, vêm sendo envolvidos nessa nova política. Trata-se de desvendar de que modo a instituição Polícia Militar da Paraíba recebeu e compreendeu a incumbência de priorizar a prevenção em Segurança Pública ou, mais precisamente, a nova filosofia de ação - Policiamento Comunitário.

O silêncio mantido pelo referido Governo, frente à sociedade e aos próprios órgãos policiais durante o processo de elaboração de um plano de segurança para o Estado da Paraíba, vinculado à nova política nacional, já era uma indicação de que dificilmente se alterariam o conteúdo e a forma da política até então levada a efeito.

Evidentemente, quando o Governo da Paraíba assinou o protocolo de intenções, assumindo o compromisso de implantar no Estado o programa do Sistema Único de Segurança Pública - cuja fundamentação teórica representa uma quebra de paradigmas tradicionais, sendo, portanto, contrária à cultura historicamente incorporada por seus profissionais - tornava-se indispensável intensificar, junto aos órgãos policiais, um processo de formação que incluísse a crítica dos paradigmas tradicionais e o esclarecimento dos fundamentos da nova política, para adequá-los à sua implementação.

Nos diálogos com policiais militares da Paraíba, estabelecidos como parte da pesquisa realizada para elaboração da presente tese, em fevereiro e abril de 2009 -, ou seja, quase 6 anos após adoção oficial da nova política - constatou-se que o alcance do SUSP e do PESP (2003 - 2007), sobretudo no que se refere à alteração do conteúdo e forma de execução, não ultrapassou o âmbito restrito da Secretaria de Segurança Pública, Tal fato é expresso claramente por um dos entrevistados na pesquisa, em sua resposta a respeito da discussão da nova política na Polícia Militar: "Institucionalmente, desconheço; eu acho que as coisas ficaram muito na instância da Secretaria. Eu ainda desconheço que isso tenha sido discutido na gerência da Polícia Civil, na Polícia Militar, eu desconheço" (Entrevistado A, OFICIAL).

Houve até mesmo um profissional com grau hierárquico superior que declarou desconhecer a existência da nova política, afirmando, literalmente: "essas políticas não chegam" (Entrevistado D, OFICAL). Corroborando a fala desse policial, outro entrevistado respondeu que só agora estava conhecendo alguma coisa do SUSP porque, até então, "não tinha internet em casa; [foi] este ano que consegui e estou estudando esse assunto" (Entrevistado C, PRAÇA).

Alguns policiais declararam ter conhecimento da existência do Plano, por meio de contatos pessoais mantidos com Movimentos Sociais ou mediante a participação em cursos de extensão na Universidade. Tal fato é revelado claramente nas entrevistas transcritas abaixo:

(...) tomei conhecimento por estar engajado em relação ao assunto, não que minha Instituição mandou; não que minha Instituição trouxe para mim, isso não. [...] minha ação, por exemplo, é de acordo com o plano, ela (a instituição) nunca trabalhou em relação àquela minha ação (ENTREVISTADO, H, PRAÇA).

(...) tenho conhecimento porque a gente faz parte do Movimento Cidadania e Segurança; em virtude disso a gente vive assim, buscando se qualificar, buscando qualificar os companheiros, orientar os companheiros para que tenham uma vida profissional mais voltada para o campo social [...]. E nesse ínterim, em virtude de manter contato com a universidade e outros setores da Sociedade Civil organizada, a gente tem conhecimento, mas a gente lá observa que no meio da tropa essa não é a visão de comando de passar aquelas coisas todas (ENTREVISTADO E, PRAÇA).

O mesmo profissional diz-se convencido de que "na elaboração de um plano devem participar primeiramente os agentes de Segurança Pública, porque não adianta um plano de segurança sem os agentes participarem, todos, sem estratificação", continua, referindo-se ao Plano Estadual de Segurança Pública:

[...] só fiquei sabendo, só ouvi falar. [...] não lembro muito bem a data, mas, salvo engano, foi em 2004; houve um fórum, inclusive a gente chegou a fazer parte desse fórum que se realizou lá no auditório da ASPLAN, e esse fórum foi pra gente tomar conhecimento de que existia o Plano Estadual, mas aí esse Plano Estadual não é do nosso conhecimento. Foi até falado que existia no sistema, na internet e tudo mais, mas a gente não teve esse recurso. [...] Pra gente conseguir esse modelo, a gente tem que chegar num lugar que tenha internet, que esse lugar disponibilize [...] até agora isso não foi fornecido, apesar da gente ter interesse. Na aula passada foi apresentado um Plano, mas lá de Pernambuco. O próprio Secretário de Segurança Pública pediu o Plano (de Pernambuco)., e aí o palestrante se dispôs a fornecer; a gente também aproveitou e pediu esse de Pernambuco para fazer um comparativo com o daqui, e aí, talvez com esse de Pernambuco a gente consiga o daqui, pra ver se a gente pode fazer uma avaliação e trabalhar em cima desse ponto (ENTREVISTADO F, PRAÇA).

O desconhecimento, em relação ao Sistema Único de Segurança - SUSP, parece não se restringir aos policiais militares da Paraíba. O Tribunal de Contas da União - TCU, em 2005, ao avaliar a aplicabilidade dos recursos financeiros repassados pelo Fundo Nacional de Segurança Pública aos governos dos Estados, destinados à implementação da nova política, detectou e relatou grande desconhecimento dos profissionais da área acerca dessa política, em nível nacional. Com o objetivo de subsidiar a avaliação, o TCU realizou um levantamento sobre o conhecimento dos policiais brasileiros acerca do SUSP. Os dados constantes no relatório revelam que 53% dos delegados e 25% dos comandantes dos Batalhões de Polícias Militares entrevistados demonstraram desconhecer o referido programa, percentuais reveladores de que um número surpreendente de profissionais dos níveis hierárquicos superiores da segurança não se apropriou das inovações apresentadas pelo Plano Nacional de Segurança Pública (BRASIL, TCU, 2005, p. 56).

Diante da comprovação do desconhecimento dos policiais brasileiros quanto à nova Política Nacional de Segurança Pública, o Tribunal de Contas da União recomendou que o Ministério da Justiça, através da Secretaria Nacional de Segurança Pública, em conjunto com as Secretarias Estaduais de Segurança Pública, realizasse atividades de divulgação do Sistema Único de Segurança Pública/SUSP e da implantação dos Gabinetes de Gestão Integrada, nas unidades federativas, com o objetivo de envolver plenamente os gestores das instituições policiais e os próprios policiais, agentes executivos da nova política.

Qualquer novo desenho de política pública que, por não ser difundido junto aos seus protagonistas, não alcance a institucionalidade devida não pode atingir os objetivos traçados, fazendo com que esses não passem de "boas intenções" ou de manobras políticas com outros fins. Na Paraíba, o "saber e o fazer" relativos à Segurança Pública não foram alterados pelo mero compromisso de adesão ao SUSP, o que reduziu essa adesão quase apenas a uma estratégia para aquisição de recursos financeiros do FNSP, como já havia ocorrido com o primeiro Plano Nacional de Segurança Pública, criado em 2.000, mencionado no capítulo anterior.

Cabe destacar, porém, que embora não tenha havido a preocupação de tornar conhecida e compreendida a nova política, no âmbito da PM, a ponto de haver policiais que desconhecem sua existência, paradoxalmente, um dado importante a ser observado é a convergência entre compreensão de segurança expressa pelos policiais entrevistados e a proposta por essa nova política, como fica claro na fala seguinte, de um policial que critica o modelo tradicional de fazer Segurança Pública, que ele considera superado e inútil:

Num período bem recente a Segurança Pública infelizmente era jogada nas mãos da polícia, e hoje isso fica evidenciado que não tem mais sentido, não se faz Segurança Pública somente mexendo com a polícia. Políticas públicas na área social, políticas públicas na área da segurança como um todo, então, a gente não vê isso, então o resultado é a ineficiência. A gente não consegue estancar a onda de crime, de violência, e com isso nós estamos lutando o tempo todo contra uma série de dificuldades, e isso é no mundo, o que é o pior. (...) a gente praticamente está enxugando o gelo, como se diz na linguagem popular. É por isto que se prende muito. É muito grande o índice de apreensão [sic], então isto mostra que há alguma coisa errada (ENTREVISTADO D, OFICIAL).

Ao mesmo tempo em que fica explicitada a discordância ao modelo tradicional de Segurança Pública, voltado essencialmente para a repressão, em virtude deste não corresponder à complexidade do problema social da violência e da criminalidade, a tendência é procurar alguma justificativa para a manutenção dessa prática, como se não houvesse outra forma de fazer Segurança Pública, ou, então, inconscientemente, houvesse a pretensão de isentar a instituição policial a que pertence de alguma responsabilidade. Assim, a preocupação é repassar a responsabilidade pelo fracasso da política de Segurança Pública, levada a efeito pela polícia, para a sociedade, inclusive cobrando a responsabilidade de outras políticas públicas.

Deve-se, porém, reconhecer que o simples fato de dar-se a conhecer o desenho de uma política, seus princípios, seus objetivos, suas diretrizes e metas não é, por si só, suficientes para que os agentes de uma política pública sejam favoráveis à sua mudança e atuem de acordo com ela.

No caso específico da Segurança Pública, deve-se considerar que historicamente esteve inspirada, predominantemente, numa cultura antagônica ao que propõe a nova política de segurança pública, seja no que diz respeito ao seu modo de fazer segurança, seja ao quadro teórico que lhe dá sustentação. A história da segurança pública, no Brasil, inicia-se pautada pela proteção das terras pertencentes à Metrópole, seguida pela proteção do patrimônio dos primeiros latifundiários, sobretudo voltada à garantia da exploração e submissão dos negros, que não eram cidadãos, mas propriedade dos senhores donos de terra. E, ao mesmo tempo, cabia à polícia através da violência conter os ânimos daqueles que se rebelassem contra as ordens da Metrópole (FERNANDES, 1973). A afirmação do direito à segurança de poucos privilegiados, em contrapartida, a negação desse direito à maioria da população, essencialmente constituída de pobres e negros, tem um longo percurso na história do Brasil, atravessando a velha República, passando pelas ditaduras do governo Vargas e a dos militares de 1964, que contribuíram para a centralidade da cultura da força na segurança pública.

Daí, uma das razões de não ser fácil alcançar a interdependência da Segurança Pública para com os Direitos Humanos e, mais ainda, a sua inspiração no respeito aos Direitos Humanos a ponto de seus profissionais chegarem a perceber as possibilidades de sua prática social fundamentalmente como uma política promotora de direitos, como defende Balestreri (2003).

Para a implantação de uma nova política é, portanto, indispensável o desvelamento, para seus próprios agentes e para a sociedade em geral, das origens históricas do autoritarismo político e social, para que possam compreender e superar o aparente antagonismo entre Segurança Pública e Direitos Humanos. É indispensável que se lhes dê a oportunidade de compreender tal antagonismo como produto de toda uma história social e política na qual, por séculos, o poder foi desejado e mantido por seus detentores como meio de defesa de seus interesses pessoais ou de seus grupos aliados, desconsiderando-se sistematicamente as regras democráticas e não como um "defeito" apenas dos profissionais da Segurança Pública. Só assim os representantes da Sociedade Civil e os agentes de Segurança Pública estarão preparados para superar esse antagonismo que leva os defensores dos Direitos Humanos a serem vistos pelos policiais como seus opositores naturais, sempre prontos a execrá-los injustamente, como mostra o Coronel Jorge da Silva (2001, p.69), e vice-versa.

Segundo um dos depoimentos obtidos nesta pesquisa, também se pode creditar essa resistência dos policiais, frente ao tema Direitos Humanos, ao distanciamento histórico em que foram mantidos quanto a essa temática, sendo a linguagem dos direitos totalmente ausentes da cultura policial antes dos anos noventa. A aceitação da gramática dos direitos só chega quando

(...) a gente consegue mostrar, quando ele (ou outro policial). consegue entender [...] que Direitos Humanos não é uma coisa boa nem ruim, é uma coisa que pertence a todos nós, independe da gente querer ou não, é uma coisa nossa e ninguém pode tirar, nem o Estado (ENTREVITADO P, PRAÇA).

Uma série de fatos importantes, porém, indicam reais possibilidades de uma nova relação entre Direitos Humanos e a polícia, na Paraíba. No ano de 1997, alguns dos policiais militares que seguiram o curso de extensão da UFPB sobre Direitos Humanos tiveram participação ativa no movimento por melhoria salarial e referiam-se, justamente, aos Direitos Humanos como argumento a favor de suas reivindicações. Em conseqüência dessa experiência de luta social, policiais militares das patentes inferiores na hierarquia criaram um "Movimento Cidadania e Segurança", com o objetivo de lutar pelos Direitos Humanos dos policiais, vítimas de desrespeito, discriminação e injustiças no âmbito da Instituição Polícia Militar da Paraíba. Obtiveram, para isso, o apoio de lideranças de outros Movimentos Sociais, criando-se assim uma interface importante entre agentes de Segurança Pública e a Sociedade Civil.

A tendência de contraposição à hegemonia do autoritarismo, historicamente mantida nas instituições policiais, é indicada também numa pesquisa realizada recentemente pelo Ministério da Justiça/Secretaria Nacional de Segurança Pública e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD (2009), sob a coordenação de Luiz Eduardo Soares, Marcos Rolim e Silvia Ramos, intitulada: "Como pensam os profissionais da Segurança Pública no Brasil", que demonstra o paradoxo enfrentado pelos profissionais da Segurança Pública, principalmente os Policiais Militares. Segundo os termos do relatório da pesquisa, esta focalizou

(...) com direito a voz e exercitando a liberdade de crítica, o principal ator no drama da Segurança Pública, o protagonista de épicos e tragédias, o cidadão comum e trabalhador - sempre alvo de cobranças, freqüentemente objeto de preconceitos -, aquele que, até hoje, paradoxalmente, não foi escutado e, por vezes, foi silenciado: o policial; a policial (SOARES et al, 2009, p. 1).

Essa disposição de deixar falarem os principais protagonistas da Segurança Pública do país permitiu que fosse revelado o que também fora sinalizado por alguns policiais entrevistados no processo de elaboração desta tese. A pesquisa realizada pela SENASP mostrou que os policiais brasileiros,

(...) em sua grande maioria, desejam, sim, mudanças institucionais profundas, querem novas polícias, não aprovam as polícias em que atuam, nem concordam com o atual modelo organizacional, e estão maduros para discutir esses temas tão complexos (SOARES et al, 2009, p. 1)

Segundo o que se observa nos dados da referida pesquisa, apresentados no quadro abaixo, os profissionais mais desejosos de mudança são os policiais militares. A surpresa maior está na convergência entre as expressões de oficiais e praças, que perfazem juntamente o percentual de 77% do desejo de mudanças, colocando-se na margem superior em relação aos policiais civis.

Opinião dos profissionais quanto à necessidade de mudança do modelo de polícia

Embora os dados acima testemunhem, no conjunto dos Estados brasileiros, a intenção de mudança por parte da maioria dos policiais militares, e, embora alguns policiais militares da Paraíba, sujeitos deste estudo, tenham expressado insatisfação com o modelo tradicional de Segurança Pública, ao contrário, tem-se percebido, neste Estado, resistência a um processo de democratização da Segurança, principalmente no que diz respeito à ampliação da prática policial pela introdução de políticas preventivas, a exemplo do Policiamento Comunitário.

Como razão desse paradoxo - por um lado a intenção, expressa por esses profissionais, de rever modelos tradicionais de Segurança Pública e, por outro, a não valorização institucional da prevenção como prioridade estabelecida pelo SUSP - certamente existem fatores imbricados também na cultura institucional que entravam o processo de mudança da Segurança Pública na Paraíba.

Tomando por referência Abranches (1987) defende-se que, antes de qualquer outra coisa, deve ser verificado se a nova política oficialmente adotada pelo Governo da Paraíba coincide realmente com sua opção política, ou se representa apenas uma jogada com vistas a garantir interesses político-financeiros do governante, já que sem verdadeiro compromisso e sem autêntica decisão política do governo e do gestor da política, esta jamais chegará a ser efetivada. Com este pensamento corrobora um dos policiais entrevistado nesta pesquisa, ao afirmar que:

A dificuldade é vontade de mudar mesmo, vontade política, há acomodação. Aqui está bom pra mim, na questão do gestor. Eu estou recebendo a verba, estou cuidando dela, estou aplicando, [...] aqui está bom. É puro comodismo... (ENTREVISTADO E, PRAÇA).

Na mesma linha de pensamento, vale lembrar a observação feita por Dalmo Dallari (BRASIL, Câmara dos Deputados, 1997), quando se refere à convergência da estrutura militarizada da polícia nos Estados, ou seja, a preservação do autoritarismo, da hierarquia e da disciplina consoantes à ideologia das Forças Armadas, com os interesses dos governos civis, que utilizam as instituições públicas, em especial a Polícia Militar, como se essas fossem instrumentos de garantia do poder do governo e não órgãos de efetivação e defesa dos direitos do cidadão.

Esta observação remete a duas questões que, no Estado da Paraíba, têm-se apresentado de forma interligada. Uma refere-se às ingerências políticas indevidas nos órgãos de Segurança Pública, a outra recai sobre um tema que tem sido motivo de grande polêmica, em âmbito nacional, desde a instauração do Estado Democrático de Direito: a militarização da polícia ostensiva nos Estados e sua vinculação às Forças Armadas. Ambas contribuem para fortalecer o caráter do conservadorismo persistente, já que, como diz Carvalho (1998, p. 119), a "força da tradição não se revela apenas na reação às mudanças", mas se mostra também no conteúdo do que se deseja manter. Apoiando-se, ainda, em Maria Lúcia S. Barroco (2009), vale dizer que "o conservadorismo fundamenta-se na valorização do passado, da tradição, da autoridade baseada na hierarquia e na ordem; nega a razão, a democracia, a liberdade com igualdade, (...)" (BARROCO, 2009, p. 172).

Nessa perspectiva, entende-se que, provavelmente, o tradicionalismo militar que persiste na Segurança Pública pode contar com o aval de governos que, nos termos de Dallari (BRASIL, Câmara dos Deputados, 1997), mantêm a idéia de força física imbricada na noção de poder político. Segundo esse entendimento, tornam-se lógicas a manutenção de uma polícia inspirada na cultura militar sob o domínio do governo civil e a preferência por uma política de Segurança Pública balizada exclusivamente no monopólio da violência.

Por outro lado, é provável também a existência de ingerências político-partidárias na Segurança Pública na Paraíba, induzidas, sobretudo, por representantes de diversos grupos oligárquicos, cuja cultura política conserva resquícios do espírito coronelista que não distingue o público e o privado, concebendo a instituição Polícia Militar como uma extensão do mundo privado, impedindo a difusão da noção da "coisa pública".

A título de ilustração, registre-se a matéria divulgada na mídia local, durante o processo eleitoral de 2006:

O parlamentar manifestou mais uma vez a necessidade urgente de tropas federais na Paraíba para garantir, pelo menos, a inibição dos agentes públicos do Governo que estão engajados na campanha [...]. Ele citou vários exemplos, lembrando a utilização de viatura da Polícia Militar para transporte de dinheiro, [...] a bandeira amarela da campanha do governador hasteada em uma unidade da PM em Campina Grande, entre outros que já foram denunciados (2010) (10).

Essa prática de ingerência política na instituição Polícia Militar, assim como a perda de credibilidade da instituição, gera preocupações em seus profissionais das várias regiões do Estado, o que os levou a elaborar um documento com 14 reivindicações a fim de "promover a dignidade da corporação, bem como oferecer segurança efetiva aos paraibanos", conforme depoimento de um policial responsável pela elaboração do referido documento. No teor da quarta reivindicação constante em tal documento, os policiais fazem menção à ingerência política, ao solicitarem que policiais militares não sejam transferidos "por perseguição política, exceto os casos de necessidade premente ou de iniciativa do solicitante" (JORNAL CORREIO DA PARAÍBA, 23.10.2006).

Práticas de ingerência política, caracterizadas pela confusão entre o público e o privado, sobretudo num Estado Democrático de Direito, remetem à discussão do tema "ética pública, que visa a propiciar no agente público a percepção de que suas decisões devem sempre se pautar pelo legal, sem se descuidar do objetivo maior: o bem comum" (ALVIM, 2008, s/n). Isto significando dizer que o governante, como representante maior do poder público, deve reger-se por "um conjunto de valores compartilhados por todos", os quais devem ser consubstanciados com os Direitos Humanos (TOSI, 2002b, p. 110). Segundo essa perspectiva, não se pode esquecer que a instituição policial militar tendo, constitucionalmente, a função social de proteger esses valores, socialmente construídos, e sendo, portanto, portadora da responsabilidade de fiscalizar, proteger e mediar os interesses coletivos, deve também inspirar-se na ética pública.

Manter a Segurança Pública da Paraíba nessa tensão entre interesses privados e interesses públicos, sem valorizar os princípios que norteiam a ética pública, desconhecendo regras democráticas e sem romper com parâmetros que tendem a confundir direitos com privilégios, pode se constituir numa estratégia para manter o status quo de grupos políticos e econômicos que se revezam no poder.

Confirmada essa suposição, pode-se dizer que, apesar deste Estado incorporar-se oficialmente à nova política caracterizada pela interdependência da Segurança Pública para com os Direitos Humanos - nas suas dimensões civis, políticas e sociais - isso não significa necessariamente que os representantes do poder público deste Estado estejam convictos da necessidade de mudança da Segurança Pública, nos moldes proposto pelo SUSP. A hipótese do desacordo entre a proposta expressa de mudança e as intenções políticas mais profundas fortalece-se pelo fato de que o Secretário de Segurança Pública do Estado, à época de incorporação da Paraíba ao SUSP, era um Coronel reformado do Exército.

Como em nenhuma instituição se pode supor a homogeneidade do pensamento de seus profissionais, não faltam policiais em cuja mente já se deu a desconstrução dessa cultura tradicional de cunho autoritário, como revela o depoimento seguinte:

Uma política de Segurança Pública democrática é aquela que não está apenas voltada para atender os interesses dos governantes, ou de quem esteja então no exercício do poder de qualquer órgão. Acho que a política pública democrática é aquela que se volta, sobretudo, para atender os interesses da sociedade, que tem exatamente como ponto norteador as demandas sociais, as demandas sociais têm que ser levadas em consideração (Entrevistado A, OFICIAL).

O Coronel PM, Jorge da Silva (2001, p. 74) afirma que a militarização de um órgão de Segurança Pública resulta de um equívoco não só dos policiais, mas também dos representantes políticos quando, sob a ótica militar, defende-se a garantia da "ordem pública", uma vez que esta só remete à idéia de "desordem pública, de combate, de guerra, contra inimigos abstratos que, no atacado, estariam à espreita em lugares suspeitos e determinados (favelas, alagados, periferia)". O mesmo autor acrescenta ainda que o modelo militarizado

(...) tem a pretensão de 'vencer' os criminosos (princípio militar da vitória), de erradicar o crime, de 'acabar' com a 'desordem'. Se o modelo militar de emprego é o recomendado para as ações de combate e defesa do Estado contra inimigos externos; se, para ações contra inimigos específicos atuando dentro do país, os meios militares podem ser acionados num quadro de excepcionalidade institucional [...], não se pode atuar com essa concepção, nem com esses meios, quando se está falando de profissionais encarregados de proteger os cidadãos, de mediar os conflitos do dia-a-dia, de preservar a paz pública em plena normalidade democrática e na vigência das garantias constitucionais (SILVA, 2001, p. 74).

Embora a desmilitarização como condição para uma mudança democratizante da Segurança Pública continue a ser uma questão polêmica, nem chegando a ser contemplada nas propostas da nova política, acredita-se que esta temática, assim como a da indistinção comumente feita entre Segurança Pública e ordem pública devam ser temas presentes na pauta de discussões da sociedade brasileira, como sugerem os Coronéis da Polícia Militar, Carlos Nazareth Cerqueira (2001) e Jorge da Silva (2001). Até mesmo o General Cardoso (BRASIL, Câmara dos Deputados, 1997), quando procura justificar a não desmilitarização da polícia alegando que a garantia da ordem pública constitui numa ação típica do Exército deixa implícita a necessidade de debate sobre essas temáticas (BRASIL, Câmara Federal, Comissão Especial de Segurança Pública, 1997).

Há indicações importantes de que um amplo movimento social voltado para a democratização e a desmilitarização das forças de Segurança Pública ecoaria facilmente dentro das próprias corporações policiais militares. Não seria por acaso que, segundo a pesquisa da SENASP, a opinião manifestada por 42% dos policiais militares sem patente de oficial (soldados, cabos, sargentos e subtenentes) revelou-se a favor da unificação das polícias, no sentido da desmilitarização. Já entre os oficiais, não mais de 15,8% optam pela unificação das polícias, com a criação de uma nova polícia não militar, deixando claro que os oficiais demonstram "muito mais apreço pela identidade militar do que os não-oficiais." (BRASIL, SENASP, Relatório Pesquisa, 2009). A mesma pesquisa sugere as razões que explicam essas opções, na medida em que revela que nas instituições militares são mais freqüentemente toleradas as relações desrespeitosas entre profissionais da Segurança Pública, desde que praticadas pelo superior hierárquico contra seu subalterno, (BRASIL, SENASP, Relatório Pesquisa, 2009, p. 5) em total coerência com a cultura do autoritarismo social.

Cabe observar, que na I Conferência Nacional de Segurança Pública realizada em agosto de 2009, um dos temas mais disputados no debate foi a desmilitarização das polícias estaduais. Na oportunidade, os praças, profissionais das Polícias Militares dos graus hierárquicos inferiores, que, como já se viu, tendem a ser favoráveis à mudança radical da referida polícia, fizeram aprovar, com o apoio da Sociedade Civil e contra a vontade da maioria dos oficiais presentes, a diretriz referente à desmilitarização das Polícias Militares do Brasil.

Esse fato demonstra a grande importância da ampliação do debate sobre o processo de democratização da política de Segurança Pública, tanto junto aos seus próprios profissionais quanto no âmbito da Sociedade Civil, aparentemente até então se tem mantido fora dessa discussão, como se delegasse o seu papel de ator social aos técnicos da área da Segurança.

Uma vez que mudanças efetivas de cunho político só ocorrem quando têm sua base de sustentação na sociedade, fica claro que o processo de democratização da política de Segurança Pública, assim como de seus órgãos, na Paraíba, depende também do poder de pressão da sociedade. Em outros termos, a efetivação de uma nova política de Segurança Pública na Paraíba, congruente com o Estado Democrático de Direito e que atenda à complexidade do problema apresentado pela violência e a criminalidade, depende de que a Sociedade Civil dê maior importância a essa luta.

Pode-se dizer, portanto, sem muitas dúvidas, que o modelo tradicional de Segurança Pública, correspondente aos interesses de grupos hegemônicos de instituições que compõem essa política, tem sido mantido por refletir a correlação de forças presente na sociedade paraibana.

Resta ainda enfatizar a escassez de engajamento dos parlamentares paraibanos na área de Segurança Pública com vistas à sua democratização, o que pode ser também indicativo de que a concepção de segurança da maioria desses parlamentares, muitos deles herdeiros políticos das velhas oligarquias, reproduz a visão tradicional de Segurança Pública. Na Paraíba, o Deputado Federal Luiz Albuquerque Couto (11) tem sido o único a abraçar a questão da Segurança Pública, de forma sistemática, como objeto de luta política em defesa dos Direitos Humanos, colocando o seu mandato parlamentar em defesa da maioria da população que não tem garantido o direito à segurança e das vítimas tanto do crime organizado quanto do poder político e da força armada dos latifundiários.

De modo geral, pode-se dizer que são certamente raros os parlamentares, seja em nível estadual, seja em nível nacional, que, na sua prática política, investem esforços necessários à mudança real e definitiva da política de Segurança Pública para sua adequação aos princípios democráticos e aos Direitos Humanos. Trata-se de uma questão importante, pois mostra uma fragilidade do nexo entre poder e direito, nos termos de Costa (2007), e os limites da efetivação do Estado Democrático de Direito.

É importante considerar, entretanto, que o fraco engajamento de parlamentares não se deve necessariamente à sua adesão ao conservadorismo, mas pode ser desestimulado pelos riscos implicados numa ação pela mudança. Note-se que o deputado Luiz Couto, já mencionado, por combater a supremacia do poder e da força sobre os direitos, além de ter sido alvo de ameaças, necessitando, em certos momentos, de proteção da Polícia Federal, tem sido visto pelos policiais militares de forma ambígua. É criticado por policiais que não comungam com o respeito aos Direitos Humanos, mas, por outro lado, é louvado por policiais que aderem à defesa dos Direitos Humanos e reconhecem que sua luta também inclui a defesa dos Direitos Humanos dos próprios policiais, conforme constatado no depoimento a seguir: "você sabe que alguns benefícios que nós temos hoje na polícia foram implementados ou teve a participação do gabinete de Luiz Couto? [...] a escala de polícia e outras coisas teve participação, a colaboração do deputado Luiz Couto" (ENTREVISTADO, F).

Este depoimento, associado aos dados da pesquisa da SENASP, comentados acima, indica claramente que, além da mudança de conteúdo e da forma, o sucesso da democratização da Segurança Pública requer também a valorização e a melhoria das condições de trabalho de seus profissionais, passando por uma revisão da relação estabelecida entre as instituições e os funcionários públicos, protagonistas dessa política. Isto significa que, para alcançar a centralidade dos Direitos Humanos na concepção e na prática da Segurança Pública, é indispensável a garantia da liberdade política e civil, além da proteção dos direitos econômicos e sócio-culturais de seus profissionais, reconhecidamente cidadãos, sujeitos dos mesmos direitos que os demais.

Para tanto, no processo de democratização dessa política pública, torna-se indispensável a revisão da relação estabelecida entre o Governo e as instituições policiais que não deveriam deixar de configurar-se como órgãos do Estado a serviço do bem-estar público, tornando-se, sobretudo, instituições inequivocamente relevantes para a garantia do Estado Democrático de Direito.

4.3. O Policiamento Comunitário como proposta de democratização da Segurança Pública na Paraíba: possibilidade e limites

Provavelmente, a mais significativa e difundida experiência de Segurança Pública em novos moldes, no país, até o momento atual, tem sido a do Policiamento Comunitário e por isso este estudo se detém na análise do que se tem dito e feito neste campo, sobretudo no Estado da Paraíba, em busca de conhecimento que possa orientar o prosseguimento dos esforços para a democratização da política de Segurança Pública e sua adequação efetiva ao Estado Democrático de Direito.

A primeira tentativa de implantação do Policiamento Comunitário no Brasil deu­se no Rio de Janeiro, durante o governo Brizola (1983 - 1986), pelo Coronel Carlos Nazareth Cerqueira, então Comandante da Polícia Militar daquele Estado. A experiência foi interrompida pelo governo seguinte (1987 - 1990), mas retomada no segundo mandato de Brizola (1991 - 1994) (CERQUEIRA e DORNELLES, 1998).

Como afirmam Cerqueira e Dornelles, as "resistências eram muito grandes e compreensíveis diante de um quadro autoritário presente na história da atuação das polícias, notadamente as militares" (CERQUEIRA e DORNELLES, 1998, p. 161). De fato, o Policiamento Comunitário, assim como outras formas de prevenção propostas na nova política nacional de Segurança Pública, difere da noção tradicional de prevenção que se encontra associada ao direito penal, o que se explicitará melhor no próximo item deste capítulo. Apoiando-se em Brantingham e Faustin, Marcos Rolim (2006, p. 113) coloca que a nova compreensão de prevenção em Segurança Pública apresenta-se em três dimensões, nos "moldes da tipologia empregada pela saúde coletiva":

(...) prevenção primária, na qual as medidas e as políticas públicas têm como alvo a comunidade inteira; a prevenção secundária, em que medidas e políticas orientam-se para a proteção de pessoas com alto risco de se iniciarem na delinqüência; e a prevenção terciária, cujo alvo específico são aqueles que já iniciaram um processo de criminalização (ROLIM, 2006, p. 113).

O autor português José Ferreira de Oliveira (2006) enfatiza que a política preventiva em Segurança Pública define-se em oposição à política repressiva, já que entende a primeira como "o conjunto de medidas, cuja intenção é minimizar as infrações (a sua freqüência, a sua gravidade e as suas conseqüências), sejam de natureza criminal ou outras e, sobretudo, quando ocorram antes da prática do ato delinqüente" (OLIVEIRA, 2006, p. 79). Prossegue esse autor observando que a prevenção pode remeter a causas sociais e econômicas quando o problema requer ações relacionadas, por exemplo, às políticas sociais; à identificação precoce de grupos ou de populações que apresentam risco particular de chegar à delinqüência; e à prática pedagógica de reinserção social daqueles que cometerem atos delituosos.

De certo modo, o projeto de Policiamento Comunitário que vem sendo experimentado no Brasil está contemplado nessa concepção ampla, cuja abordagem chega a aproximar-se das concepções de prevenção desenvolvidas na área da saúde. Existem, entretanto, algumas especificidades em relação a essa estratégia de prevenção, já pontuadas no capítulo anterior, como a ênfase na necessidade de ampla participação social.

Cabe dizer que não há consenso quanto à denominação dessa prática. Na literatura afim aparecem as expressões polícia comunitária, polícia de proximidade, polícia interativa. De qualquer forma, via de regra, a denominação tem como referência a ação pró-ativa, ou seja, a intervenção antes de que o fato delituoso aconteça; o estabelecimento de aproximação e parceria com a comunidade local, permitindo a construção de novas relações entre polícia e sociedade e a questão da territorialidade, vista na perspectiva do espaço da cidadania e da integração no cotidiano de uma determinada comunidade.

A regra básica que rege essa nova forma de atuação policial é a de intervir nas várias frentes antes que o crime aconteça, demandando a revisão de velhos paradigmas antidemocráticos da Segurança Pública, de caráter reativo e balizado na força, uma vez que a sua filosofia prioriza a busca de saídas para os múltiplos problemas que possam contribuir para situações de violência, enfrentados em cada comunidade.

Considerando, portanto, que o SUSP, assim como o Fundo Nacional de Segurança Pública e autores como Cerqueira e Dornelles (1998), Mesquita Neto (2003) e Rolim (2006), dentre outros, têm denominado essa nova forma de fazer segurança como Policiamento Comunitário, optou-se neste trabalho por essa denominação.

Entende-se que esse fazer diferente merece ser discutido no campo teórico, cabendo perguntar se esse papel de ator principal na prevenção da violência realmente compete à polícia, sobretudo considerando-se a necessária conexão com a questão dos Direitos Humanos e os três níveis, primário, secundário e terciário, conforme a classificação feita por Rolim (2006, p. 113). Nesse sentido, cabe indagar: essa categoria profissional não estaria sendo convocada a atuar nessa dimensão em virtude do vazio existente na estrutura da Segurança Pública quanto a outros profissionais necessários à intervenção social, ou mesmo de uma insuficiência geral do Estado com relação à garantia dos Direitos Humanos nas suas múltiplas dimensões? Para contribuir nessa discussão, no anexo 5, deste estudo são apresentadas as estratégias de intervenção do modelo tradicional de Segurança Pública e do Policiamento Comunitário.

A preocupação com o tema Policiamento Comunitário não se limita ao Brasil, já que vem sendo estudado e experimentado mundialmente. Estudo realizado por David H. Bayley e Jenome H. Skolnick (2002), em vários países (Austrália, Canadá, Noruega, Suécia, Dinamarca, Finlândia, Grã-Betanha, Japão, Cingapura e Estados Unidos), mostra que Cingapura "é o melhor exemplo de transformação das tradicionais estratégias policiais reativas em um programa de Policiamento Comunitário amplo". Os resultados alcançados na pesquisa mostram que diante "do medo do crime pela população e da opinião do público em relação à polícia", Cingapura optou pela implantação do Policiamento Comunitário, a partir da fixação de bases policiais nos bairros, articuladas aos conselhos populares que já funcionavam nas localidades. Dentre outras estratégias adotadas pelo novo sistema, os autores destacam a convocação da "rede já existente das organizações populares na cidade, tais como os Comitês Consultivos Constitucionais e os Conselhos de Moradores, a se envolverem no estabelecimento de objetivos e métodos [agenda] para o policiamento local (...)" (BAYLEY; SKOLNICK, 2002, p. 52 -53)

Em 2002, segundo Rolim (2006, p. 68), a "Rede Européia para a Prevenção do Crime promoveu uma grade conferencia em Aalborg, Dinamarca, [...]" com o objetivo de trocar "experiências entre boas práticas de prevenção entre os Estados membros dessa rede, sendo que o Policiamento Comunitário esteve no centro dos debates". Argumenta Rolim (2006) que esse encontro pode ser indicativo de que o Policiamento Comunitário está, cada vez mais, fazendo parte do cotidiano da Segurança Pública das nações democráticas.

No Brasil, vários Estados membros da federação têm demonstrado interesse por essa experiência, entretanto as iniciativas concretas ainda têm se dado de forma apenas incipiente, pontual sem alcançar a institucionalização definitiva como política de estado. Muitas vezes, essas experiências têm sido atribuídas apenas a um determinado agente público da instituição policial que, isoladamente, acredita na democratização da Segurança Pública.

Na Paraíba, a discussão sobre Policiamento Comunitário antecede o SUSP. A primeira atividade relacionada a essa temática, de caráter educativo, deu-se em 1997, articulada pela UFPB em parceria com a Polícia Militar da Paraíba e Conselho Estadual de Defesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, através do "Curso de Polícia Comunitária". Esse curso de extensão universitária foi realizado para os oficiais da PMPB, com o objetivo de sensibilizar as autoridades da área de Segurança Pública para a necessidade de mudanças na administração e na filosofia de atuação policial. Na articulação com a Polícia Militar da Paraíba, contou-se com a relevante colaboração do Coronel da PMPB Washington França da Silva, na época Capitão. O curso foi ministrado pelo Coronel Carlos Nazareth Cerqueira, do Rio de Janeiro, pioneiro na experiência no Brasil, o qual prestou relevante assessoria à UFPB também em outras atividades educativas nessa mesma perspectiva.

Em 1999, por ocasião do encerramento de um dos cursos de extensão sobre "Gestão em Policiamento Comunitário", realizou-se um seminário aberto ao público que contou com a participação ampliada de membros da Sociedade Civil paraibana, da mídia, de outros órgãos públicos, além de outros policiais civis e militares não vinculados ao curso. Na ocasião foram apresentadas experiências inovadoras de sete Estados brasileiros (DIAS, 1999, p. 133). Nos anos seguintes, foram realizados três outros cursos de extensão sobre Gestão em Polícia Comunitária, com a mesma diversidade de público.

Os dados encontrados revelam que, na Paraíba, a primeira tentativa de implantação de experiências em Policiamento Comunitário deu-se no segundo semestre de 2002, em João Pessoa, a capital do Estado, e em Campina Grande, segunda cidade mais importante em número de habitantes e em desenvolvimento sócio-econômico dessa unidade federativa. Encontrava-se em curso o processo eleitoral unificado para Presidente da República e Governador do Estado, que pode ser visto como elemento motivador das iniciativas, além da disponibilidade de recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública destinado especificamente para a essa atividade.

Em João Pessoa foram escolhidas, de forma aleatória, as comunidades populares de Paratibe e Mussumago. Essas comunidades estão situadas nas proximidades do Conjunto Habitacional Valentina Figueiredo, em direção à orla marítima sul, com grande déficit de serviços públicos, portanto com uma série de problemas sociais. Lideranças dessas comunidades estavam engajadas nas atividades do Núcleo de Defesa da Vida - NDV, situado no referido Conjunto, o qual desempenha papel relevante no processo de construção de uma cultura em prol da defesa dos Direitos Humanos.

Uma monografia (SILVA, 2002) realizada por um Sargento da Polícia Militar da Paraíba, aluno do curso de Especialização em Direitos Humanos, promovido pela CDH/UFPB em 2001-2002, traz depoimentos de policiais e de líderes comunitários que participaram desse projeto de Policiamento Comunitário, revelando o amadorismo e a precariedade com que se deu a sua implementação. Segundo a pesquisa que baseou essa monografia, houve a participação da comunidade, que desejava "ter uma relação de parceria com a polícia comunitária e não uma relação de animosidade" (Fala da comunidade, Apud SILVA, 2002, p. 66). Nessa mesma perspectiva se expressa um dos policiais participantes no projeto: "A comunidade recebe a Polícia comunitária maravilhada, pois a tem como uma polícia diferente da polícia tradicional" (Fala da polícia, Apud Silva, 2002, p. 66). Em outros depoimentos, porém, se expressa um sentimento de dúvida, de incertezas e de fragilidade em relação à experiência:

É uma polícia que realmente funciona, sendo uma promessa para melhorar a segurança das comunidades, mas tem que ter um maior apoio da Secretária de Segurança Pública e da própria Polícia Militar, para que possa continuar logrando êxito em suas ações (fala do policial Apud SILVA, 2002, p. 67).

O autor dessa pesquisa destaca a falta de infraestrutura e de apoio institucional em consonância com a fala de um membro da comunidade, que informa que "a polícia Comunitária tem muita dificuldade de material e de viaturas, pois a única viatura que atualmente é exclusiva da Polícia Comunitária está quebrada e não pode rodar" (Fala da polícia, Apud Silva, 2002, pág. 76). Outro problema apresentado pelos Entrevistados foi a falta de incentivo aos profissionais. "Não há gratificação especial para os policiais comunitários. Eles recebem o mesmo salário dos policiais comuns da tropa. Há o medo de se colocar gratificação para não atrair policiais do tipo mercenários" (Fala da polícia, Apud SILVA, 2002, p. 77). Destacou-se, ainda, a falta de disponibilidade de policiais: foram indicados apenas 11 policiais militares

(...) para efetuar o serviço nos bairros de Paratibe e Mussumago, para atuarem nos três turnos. Apesar do trabalho de polícia contar com o apoio da comunidade, o número de policiais para a experiência ainda não tem sido o necessário para os dois bairros (SILVA, 2007, p. 274).

Segundo o mesmo autor, havia a preocupação dos atores institucionais e sociais em "cumprir as metas pré-estabelecidas, mas vem encontrando dificuldades pela falta de apoio dos próprios órgãos públicos envolvidos na implantação do projeto, conforme análise dos policiais e da comunidade" (SILVA, 2002, p. 66). Em vista desses dados, apesar de se ter anunciado que as experiências realizadas nas duas comunidades contavam com recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública, alega Silva (2007, p.276) que surgiu dúvidas por parte da comunidade, como também por parte dos policiais envolvidos no Policiamento Comunitário, sobre a real existência de apoio financeiro.

No segundo semestre de 2003, quando o novo governo da Paraíba já havia se vinculado ao SUSP, portanto, contando com apoio financeiro do FNSP, a Secretária Estadual de Segurança de Pública, através do Sub-Secretário (12), Geraldo Amorim, deu início ao processo de discussão sobre a criação de um Programa Estadual de Polícia comunitária na Paraíba.

A Comissão de Direitos Humanos da UFPB foi convidada a participar das discussões iniciais (13), sendo sugerida a avaliação da primeira experiência de Policiamento Comunitário. Com a presença de representação das comunidades envolvidas, policiais que participaram do primeiro projeto e do grupo que já vinha discutindo a criação do Programa, foi realizada a avaliação do projeto anterior.

Nesta avaliação, confirmaram-se os problemas apontados acima. A falta de infraestrutura e a falta de apoio institucional constituíram-se no foco central dos problemas abordados. Alegou-se que os policiais integrantes do projeto passaram a ser escalados para desenvolver a atividade policial tradicional - repressiva - na mesma comunidade, sob a justificativa da falta de efetivo para cobrir todas as funções da polícia, sendo aqueles aos poucos redirecionados para fazer patrulhamento tradicional, inviabilizando definitivamente o primeiro projeto.

Em seguida, ainda em 2003, outros dois bairros de João Pessoa foram escolhidos para a implantação de novo projeto de Policiamento Comunitário. Os bairros apresentavam características socioeconômicas e políticas distintas. Um deles, o Conjunto dos Bancários, de classe média, não estava mobilizado para essa atividade política e, apesar de contar com serviços de infraestrutura razoavelmente bons, vinha enfrentando constantes problemas relacionados à Segurança Pública, principalmente crimes contra o patrimônio.

O outro bairro escolhido, Cruz das Armas, um bairro popular que enfrentava vários problemas sociais, inclusive com ocorrência de vários homicídios de jovens, relacionados principalmente à expansão do tráfico e ao consumo de drogas naquela comunidade. Nesse bairro, contando com o apoio da Igreja Católica, havia o grupo social Cidadania e Paz, em processo de luta, reivindicando do governo saídas para esses e outros problemas e realizando anualmente uma Marcha pela Paz e a Cidadania, articulando outras comunidades circunvizinhas.

Após a capacitação dos profissionais e membros da comunidade, ministrada por uma comissão coordenada pelo próprio subsecretário de Segurança Pública, implantou-se inicialmente a experiência de Policiamento Comunitário, no bairro Bancários. Com declarado empenho pessoal do sub-Secretário, Geraldo Amorim, que era adepto do Policiamento Comunitário e morador daquela localidade, a experiência iniciada no bairro despertou grandes expectativas, mas não deixou de ter dificuldades desde os primeiros momentos. A precariedade do projeto revelou-se logo através das cobranças da comunidade quanto à falta de espaço físico para instalação da base de Policiamento Comunitário, essencial ao seu funcionamento, dentre outras. Além disso, todos os problemas enfrentados na primeira experiência repetiam-se ali, não se percebendo o efetivo engajamento do gestor principal da política, do Secretário de Segurança Pública, nem tampouco da instituição Polícia Militar. Essas e outras limitações podem ter comprometido a sustentabilidade do Policiamento Comunitário, no Bairro dos Bancários.

No bairro de Cruz das Armas, os problemas afloraram antes mesmo da implantação da experiência concreta. A metodologia de trabalho adotada pela assessoria convidada temporariamente, de outro Estado do país, para realizar esse programa, gerou descontentamento entre os membros da Comunidade, na sua maioria integrantes do grupo local acima mencionado. A cultura política dessa organização popular convergia para a prática do exercício da cidadania democrática, enquanto a condução do trabalho oscilava entre o clientelismo e a transferência de responsabilidade dos problemas enfrentados na localidade aos membros da comunidade, contradizendo a tradição de luta pelos direitos e serviços públicos característica daquela comunidade.

Diante das discordâncias, como forma de fragilizar politicamente o grupo Cidadania e Paz, seus oponentes optaram pela tática de integrar ao processo de implantação do Policiamento Comunitários outros moradores da comunidade, menos envolvidos com sua história de lutas e que não haviam participado das atividades de capacitação oferecidas pela Secretaria de Segurança Pública. A falta de consistência da proposta metodológica, todavia, somada aos diversos outros problemas, restringiu essa experiência ao processo inicial de mobilização, não sendo implantado de fato o Policiamento Comunitário em Cruz das Armas.

Em 2007, foram montadas tendas em vários lugares de João Pessoa, nas quais se encontravam a inscrição "Polícia Comunitária". Mesmo sem corresponder de fato às características da filosofia de ação policial nos moldes do novo fazer Segurança Pública democrático, tentava-se passar para a sociedade a impressão de uma retomada dessa linha de ação. Ignorava-se, entretanto, a necessária realização de diagnóstico social de cada comunidade, de planejamento de atividades de acordo com os as prioridades levantadas, um processo orientado para criar proximidade com a sociedade e do estabelecimento de formas e procedimentos apropriados para efetivar a participação social no projeto. Ou seja, não se havia incorporado, de fato, a filosofia de Policiamento Comunitário e os policiais dessas tendas atuavam segundo o estilo tradicional da Segurança Pública, não indo além do que Rolim (2006) chama de prevenção terciária.

É importante assinalar que o fracasso das experiências iniciais em João Pessoa não se pode atribuir à simples falta de experiência e conhecimentos, no Estado, já que em Campina Grande, no segundo semestre de 2002, iniciou-se uma experiência análoga, contando, porém, desde seu início, com condições de sucesso claramente melhores.

Em Campina Grande, o processo de implantação do Policiamento Comunitário foi iniciado sob a responsabilidade do 2º Batalhão de Polícia Militar - 2º BPM. Naquela localidade foi feita a divisão por região, sendo a zona oeste a primeira escolhida. A implantação dessa experiência contou com a liderança de policiais militares que tinham participado de um curso nacional de Policiamento Comunitário, promovido pela Secretaria Nacional de Segurança Pública.

Pautando-se em estudo que indicou no bairro do Bodocongó (14) sinais de tendência para aumento em alguns tipos de crime, além de está situado longe do centro da cidade - o que, em casos de denúncias e solicitação da população, dificultava o deslocamento dos policiais para o local em tempo suficientemente rápido para evitar a ocorrência de crimes e levar à redução do índice de criminalidade (ENTREVISTADO N, OFICIAL) - essa foi a área da cidade escolhida para a primeira experiência de Policiamento Comunitário.

Em Bodocongó foram realizadas várias reuniões com o objetivo de sensibilizar e mobilizar os moradores do bairro para a nova forma de fazer Segurança Pública. A mobilização da população fez-se através de convite formal do 2º BPM-PB, já que naquele momento contava-se com apoio do Comandante local. O convite foi prioritariamente dirigido às entidades sociais organizadas naquela localidade, considerando-se sua representatividade política como agentes da cidadania aptos a engajar-se no projeto. Para formalizar o envolvimento da sociedade, desde o primeiro momento agilizou-se a criação de um Conselho Comunitário de Segurança Pública como canal formal de participação social.

Consoante à experiência de outros Estados, segundo o oficial da Polícia Militar de Campina Grande entrevistado nesta pesquisa (ENTREVISTADO O, OFICIAL), no nível do Comando do 2º BPM elaborou-se um documento intitulado Normas de Ações Gerais - NAG, com o objetivo de determinar as normas disciplinares que garantissem a aplicação das ações previstas, tanto no aspecto administrativo quanto operacional, pelos policiais destacados para a nova base de Policiamento Comunitário implantada naquela localidade da zona oeste da cidade.

A implantação dessa primeira experiência, em Campina Grande, deu-se em 13 de setembro de 2002, com a inauguração da base comunitária, contanto com contingente de policiais e equipamentos muito mais adequados do que se observou em João Pessoa: um oficial comandante da base, um efetivo de 35 (trinta e cinco) policiais militares, revezando-se numa escala de 12H00 de serviço por 36H00 de folga, duas viaturas de Rádio Patrulhamento circulando na área e mais uma terceira viatura e um posto de rádio fixo para atender a chamados e atuar imediatamente em casos de necessidade (ENTREVISTA N, OFICIAL).

O mesmo entrevistado informa que, considerando o sucesso dessa experiência no que concerne à redução de ocorrências criminosas na área em que atuava o Policiamento Comunitário, em novembro do mesmo ano, o Comando do 2º BPM implantou com as mesmas características uma nova base na zona leste, no bairro José Pinheiro, onde seguiu-se a mesma metodologia que caracterizara a primeira iniciativa: criação de um Conselho Comunitário de Segurança Pública, disponibilidade adequada de recursos materiais e de recursos humanos, elevando-se o efetivo a 45 policiais militares.

A partir de 2004, conforme declarou um entrevistado, a mudança de comandante na Polícia Militar em Campina Grande gerou uma quebra de continuidade do projeto de Policiamento Comunitário na cidade, retomado, porém, em 2006, com o incentivo de novo comandante do 2º BPM, momento em que foram implantadas mais duas outras Bases de Policiamento Comunitário na zona Norte e Sul, com a mesma estruturação das demais. (ENTREVITADO N, OFICIAL)

Assim emergiu a experiência, com a cidade dividida em quatro zonas, oeste, leste, norte e sul, com suas quatro bases de Policiamento Comunitário e quatro Conselhos Comunitários de Segurança Pública. Apesar de apresentar estruturação bem melhor do que a de João Pessoa, o processo de implantação do Policiamento Comunitário em Campina Grande não deixa de sofrer oscilações, com altos e baixos na sua execução, a depender da sensibilidade do comando do policiamento local à proposta.

Em razão dessa instabilidade, segundo depoimento de um policial entrevistado, em maio de 2008, os Conselhos Comunitários de Segurança convocaram e realizaram o I Fórum de Segurança Comunitária de Campina Grande. Este teve como objetivo discutir os problemas que dificultavam o andamento e o sucesso do Policiamento Comunitário. Esse evento gerou documento sobre os problemas levantados, encaminhados aos gestores da política pública de segurança no Estado (Entrevistado N, OFICIAL).

Fica claro que houve diferenças significativas entre as experiências de Policiamento Comunitário de Campina Grande e a de João Pessoa. É provável que o fato da própria Instituição Polícia Militar ter assumido diretamente a coordenação do projeto em Campina Grande, inclusive estabelecendo ela mesma as normas institucionais para o Policiamento Comunitário, tenha sido um fator crucial para explicar o grande saldo positivo em seu favor, nesta comparação. De parte da sociedade, dois fatores merecem destaque: um deles é a criação dos Conselhos Comunitários de Segurança e o outro a aplicação de uma estratégia política de articulação de outras forças sociais da cidade ao projeto, que culminou no Fórum de 2008.

De forma geral, porém, as duas cidades deparam-se também com dificuldades comuns, sobretudo a falta de valorização da prática preventiva em Segurança Pública, se não por parte da população, por parte do aparato institucional do Estado. Como alega Silva (2007, p. 277), as experiências de Policiamento Comunitário, neste Estado, "têm se pautado em pequenas iniciativas estaduais, face às conjunturas políticas dos gestores e às exigências do SUSP".

A resistência ao Policiamento Comunitário, sobretudo pelos que detêm a hegemonia na instituição, conforme alega um dos entrevistados (ENTREVISTADO O, OFICIAL), tem consequências para a estabilidade dessa prática, uma vez que não há gratificação aos policiais que atuam nesse projeto, ao contrário do que acontece com a atuação repressiva, que garante uma gratificação a todos os policiais participantes. Talvez seja essa uma das principais razões para a desmotivação dos policiais a participarem desse novo modo de fazer Segurança Pública.

Cabe pontuar que a dificuldade de institucionalização da prevenção na Segurança Pública parece não se restringir ao Policiamento Comunitário. Conforme revelam os depoimentos colhidos nesta pesquisa, o Programa Patrulha Escolar e o Programa de Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência - PROERD tampouco têm recebido, no âmbito institucional, a importância correspondente à sua relevância social. Ambos os programas antecedem ao novo Plano Nacional de Segurança Pública. A Patrulha Escolar, ora precariamente sobrevivendo, ora deixando de existir, em algumas unidades da Polícia Militar do Estado, depara-se com problemas semelhantes aos do Policiamento Comunitário, habitualmente alegando-se a fala de efetivo policial para sua manutenção satisfatória.

O PROERD, que consiste numa prática pedagógica por parte de policiais militares em escolas, principalmente do ensino fundamental, voltada para a prevenção do consumo de drogas, conseguiu "institucionalizar-se". Esse programa, apesar do reduzido número de agentes, vem sendo difundido nas unidades da PMPB, todavia a sua institucionalização tem uma característica que contraria a lógica das demais políticas públicas estatais. Os funcionários públicos que atuam no programa são classificados como voluntários, ou seja, os policiais militares que ministram as aulas o fazem por escolha própria, contando para isso com uma pequena compensação financeira, porém não têm essa atividade computada na sua carga horária funcional.

De outro lado, apesar da precariedade dos projetos de Policiamento Comunitário na Paraíba, as entrevistas realizadas para esta pesquisa revelam que as expectativas de mudança da segurança, alimentada por alguns profissionais, têm como referência o Policiamento Comunitário. Neste sentido, diz um entrevistado:

O ideal dos governos de modo geral, dos governantes, era que tivessem esse entendimento da importância da filosofia de polícia comunitária. Daí podia chegar pro comandante de polícia, o comandante geral dava ordem para os seus subordinados, podendo espalhar para os batalhões e pelotões o projeto de polícia comunitária. (ENTREVISTADO P, PRAÇA).

A crença na "ideologia de Policiamento Comunitário" por parte de alguns profissionais é tão grande que, em João Pessoa, há policiais militares dos níveis hierárquicos inferiores que afirmaram estar desenvolvendo, a seu modo, o Policiamento Comunitário na comunidade onde trabalham, voluntariamente, segundo depoimento obtido (ENTREVISTADO C, PRAÇA). Apesar do voluntarismo, amadorismo e precariedade dessa atuação, é importante como indicativo de intenções, pois, como afirma outro profissional, ela é do conhecimento de superiores o que significa dizer que conta com o consentimento destes, pois caso contrário os policiais da base não teriam essa liberdade que afirmam ter.

Os depoimentos revelam, também, a existência de identificação da comunidade com os profissionais que atuam no Policiamento Comunitário:

A própria comunidade identifica, ela sabe, ela conhece o policial, inclusive nesse segundo projeto que foi nos Bancários, quando tinha uma viatura que não fosse da polícia comunitária, eles já diziam: 'o que é que esta viatura está fazendo aqui? Nós não queremos essa polícia aqui, nós queremos policiais do bairro que a gente conhece, que sabe de suas ações, de suas maneiras de tratar as pessoas'. Muitas vezes a gente estava só de passagem, mas o pessoal não aceitava, porque já estavam tão vinculados ao policial comunitário, porque é como se diz, a polícia é o público e o público é a polícia, os dois se identificam muito, e de tanto ter essa convivência cada um tem o seu papel (ENTREVISTADO H, PRAÇA).

De certo modo, constata-se que há uma tendência de maior aceitabilidade da gramática que trata do Policiamento Comunitário do que dos Direitos Humanos. O argumento que leva ao favorecimento do Policiamento Comunitário, por parte dos policiais, pauta-se principalmente na preocupação com a mudança da imagem social da polícia junto à comunidade.

Há, além disso, certo consenso, por parte dos entrevistados, em que o foco da resistência ao Policiamento Comunitário é fruto da concentração do poder nas formas concretas de execução política de Segurança Pública.

Segundo um dos policiais Entrevistados:

(...) a sensibilização para a participação direta da população nas ações de políticas públicas de segurança, a exemplo do Policiamento Comunitário, é a única saída para que essas experiências não se limitem à retórica ou resumam-se a ações ínfimas (Entrevistado O, Oficial).

4.4. Os desafios da nova política remetem à reelaboração cultural

A política de Segurança Pública na Paraíba, apesar de manter-se ainda inspirada na cultura de poder e força, vem sendo pressionada para incorporar valores da cultura dos Direitos Humanos, entendidos nas suas múltiplas dimensões, sobretudo quando a estratégia de mudança do modo de fazer-se a Segurança Pública baseia-se no Policiamento Comunitário.

O Policiamento Comunitário tem se apresentado como uma relevante estratégia política de mudança cultural para os policiais militares, cujo tirocínio foi historicamente imbuído de preconceitos antagônicos aos Direitos Humanos. Ao contrário, o Policiamento Comunitário associa-se à cultura dos Direitos Humanos, uma vez que sua prática é inseparável do exercício da cidadania, tanto por parte dos próprios policiais quanto dos cidadãos em geral, na medida em que demanda que a sociedade seja partícipe no pensar, no fazer e no monitorar da política preventiva em Segurança Pública como condição para fazer valer o direito político, num contexto que até então tendeu a negá-lo.

O Policiamento Comunitário também perpassa a dimensão social dos Direitos Humanos, ao defrontar-se com problemas sociais, seja sob a forma de insuficiência da infraestrutura urbana como, por exemplo, falta de iluminação pública, terrenos baldios, que tornam ambientes propícios à prática do crime, seja por ter de articular-se com as demais políticas públicas, diante dos problemas detectados na comunidade. Este modo de fazer segurança pública não se desvincula da garantia dos direitos civis, pois em se tratando de prevenir o crime numa perspectiva política e social, evitando que os cidadãos sejam vítimas de perda de sua liberdade civil, necessariamente os demais direitos passam a se constituir em base para a garantia desta liberdade.

Além disso, deve-se considerar que a prevenção em Segurança Pública, sob a forma do Policiamento Comunitário, não deixa de estar articulada com a política repressiva, quando esta se fizer necessária, devendo-se, portanto, qualificar e estabelecer claros critérios para seu exercício.

Sendo esse modo de fazer Segurança Pública tão diferente do costumeiro, representando um rompimento com uma cultura tradicional, considera-se que seria inevitável uma forte resistência, no âmbito da instituição policial, em relação ao Policiamento Comunitário. Neste sentido, uma estratégia política de formação para o Policiamento Comunitário deveria ser seriamente encarada quase como um ritual de passagem de uma cultura autoritária para uma cultura democrática.

Argumenta Rolim (2006, p. 93) que essa resistência surge principalmente pelo fato do Policiamento Comunitário representar a negação do que historicamente foi considerada a "essência" do fazer Segurança Pública: a repressão. O referido autor, apoiando-se em Brodeur, alega que se deve lembrar que a "cultura policial está profundamente marcada pela noção de retribuição - o que se transforma, na prática, na ideia de que os infratores merecem um tratamento duro ou violento" (Apud, ROLIM, 2006, p. 953)

Considerando-se essa argumentação, vale lembrar que a cultura da violência atravessa a Segurança Pública independentemente do contexto político. É o que se confirma num depoimento que repete a representação da Segurança Pública, na atualidade, nos moldes do velho modelo, considerado de conhecimento público, conforme abordado no capítulo 2, deste trabalho:

(...) nós somos ensinados desde a época da ditadura até hoje que a comunidade é nossa inimiga, e o inimigo tem que morrer. A gente felizmente, não é literalmente assim, mas, é a caricatura, é a forma como às vezes a pessoa pensa, "eu tenho que descer na favela se eu não quebrar dez favelados pra mim foi péssimo". Sim, aí é como eu falo com o pessoal do choque, eu queria que vocês fizessem isso com o pessoal lá de cima, com o desembargador, o pessoal da alta sociedade, se vocês fizessem isso eu ficaria super satisfeito. É fácil ir pra comunidade e fazer isso, quebrar todo mundo, quebrar o trabalhador que vem do trabalho, de forma arbitrária isso é fácil porque ele não vai denunciar. É um contexto que a gente faz lá, eu não admito esse tipo de coisa, nós não admitimos. Se o cara não reagiu, se ele não fez nenhuma ação que gere uma reação, ele será algemado, levado e conduzido. Se ele reagir, logicamente eu sou policial, eu tenho meu direito à questão física, se ele reagir com tiro ele vai levar tiro, se ele reagir com tapa vai levar tapa do mesmo jeito, eu não fui pra rua pra apanhar, isso não é ser polícia comunitária, polícia comunitária é você cumprir na lei, ou seja, a lei diz que existe o uso progressivo da força, então você tem que cumprir isso (ENTREVISTADO H, PRAÇA).

Neste depoimento encontram-se os acertos, equívocos, certezas, ambigüidades e também limitações culturais enfrentados pelos funcionários públicos comumente responsabilizados pela configuração negativa do modelo de Segurança Pública falido, mas insistentemente vivo mesmo que, por vezes, haja consciência de que este se opõe ao Estado Democrático de Direito. Como declara o entrevistado, ter a sociedade como inimiga faz parte da estratégia de combate. Essa estratégia, conforme consta do cap. 2, foi difundida na Segurança Pública brasileira inspirada na Doutrina de Segurança Nacional, desde o primeiro momento do golpe militar de 1964. Ainda hoje mantida na cultura policial sob a justificativa do monopólio estatal da violência, a estratégia de combate empregada tem gerado violação de Direitos Humanos, em decorrência do uso abusivo da força. Ao serem usadas pelo "pelotão de choque" para lidar, por exemplo, com as manifestações dos Movimentos Sociais, as estratégias de combate têm sido motivo de reclamos da sociedade.

Neste aspecto, cabe observar que os nossos governos democraticamente eleitos não dispensam a prioridade do uso da força repressiva, convocando preferencialmente esse pelotão como forma de responder aos Movimentos Sociais. Essa prática tem feito parte do cotidiano do hoje e não apenas do ontem. Vários exemplos poderiam ser citados, mas como ilustração, colocam-se aqui apenas dois exemplos recentes de grande repercussão na mídia. Um deles refere-se ao caso do uso do Choque da Polícia Militar de São Paulo, em junho de 2009, contra os manifestantes da Universidade de São Paulo ­USP, que lutavam por reajuste salarial (15). O segundo caso ocorreu em Campina Grande, na Paraíba, março de 2009, quando a tropa de choque foi empregada contra o movimento estudantil em luta para que não se aumentasse o preço das passagens de ônibus.

Importa notar, entretanto, que se é essa mesma polícia que o governo aciona para reprimir os Movimentos Sociais, ou para adentrar, preparada para usar plenamente sua força, as comunidades pobres e os presídios submetidos ao chamado "pente fino", o mesmo não ocorre em relação às classes mais favorecidas da sociedade. Caso seja necessária a presença da mesma polícia em locais considerados socioeconomicamente privilegiados, é de conhecimento público, facilmente comprovável pelos arquivos da imprensa, que sua intervenção não usará a força indistintamente, alegando-se aí sim, o nexo entre poder/força e o respeito aos Direitos Humanos, constatando-se então a presença do Estado Democrático de Direito quase como privilégio de apenas parte dos cidadãos.

Diante deste viés ideológico, adverso à cultura democrática, que perpassa a persistente representação tradicional de Segurança Pública, é importante chamar a atenção para o fato de que as ações de Segurança Pública são formas de intervenção política do poder executivo. Pouca diferença faz, nesse caso, se a política a ser seguida está sistematizada em documentos legais com diretrizes, metas e métodos democráticos, porque, independentemente de sua racionalidade, nos termos weberianos, sua prática concreta depende de decisões do governador ou de seus prepostos, sejam eles quem forem, seja qual for sua orientação política. Cabe aqui a advertência de Augusto de Franco, numa publicação Carta Rede Social nº 126 (07/12/2006), em artigo denominado, "O mito da política pública", ao dizer que: "Deveríamos estar mais preocupados em saber se uma política é uma política democrática (e democratizante) do que se ela é ou não é, nominal ou formalmente, uma política pública", isto é, sob efetivo controle da cidadania.

Diga-se, ainda, que as incongruências que se apresentam de um lado, entre as exigências do Estado Democrático de Direito, caracterizada pela cultura dos Direitos Humanos e, de outro, expressa através da representação tradicional da Segurança Pública antidemocrática, não são exclusividade da Paraíba e, sim, representam a cultura hegemônica adotada ao longo da história pelos policiais brasileiros, independente de serem militares ou civis.

Tudo o que acabamos de considerar aponta para o enorme desafio implicado no caminho necessário para alcançar-se a democratização da Segurança Pública, seja na Paraíba ou no Brasil. Neste sentido, percebe-se o peso significativo que se deve atribuir ao foco cultural no processo de mudança da Segurança Pública, condizendo com a advertência de Lynn Hunt (2009) ao afirmar que num processo de mudança histórica deve-se necessariamente levar em consideração a mudança da mente dos indivíduos. Para a referida autora, a mudança de contexto social e político não deve ser vista como suficiente para produzir-se uma mudança cultural de forma coletiva ou, em outros termos, de forma homogênea, nem em um determinado coletivo de profissionais, nem na sociedade em geral. No processo de mudança cultural, antes de tudo, deve-se levar em consideração "o modo como as mentes individuais compreendem e remodelam esses contextos" (HUNT, 2009, p. 32).

A mesma advertência aplica-se, certamente, ao caso específico da assimilação da cultura democrática e preventiva em Segurança Pública, que se pode considerar uma mudança de alcance histórico, já que o papel atribuído à Segurança Pública, ao longo de sua existência, através de seus variados períodos e órgãos executores, sempre foi o de controle repressivo sobre a sociedade e nunca, ao contrário, submetido ao controle social. Assim, não se pode esperar que a construção de uma nova cultura venha a ocorrer na velocidade que requerem a crise da Segurança Pública e o problema social da violência e da criminalidade. De fato, basta lembrar que já se passaram 22 anos desde o início do processo de mudança democratizante na organização político-jurídica do Estado brasileiro, mas nem por isso verificou-se a adequação da Segurança Pública à nova ordem política e social. Por outro lado, há que lembrar também que só tardiamente passou a ganhar força um pensamento social, mais amplamente compartilhado, com relação à necessidade de adequação dessa política ao contexto democrático. Tal avanço teve de esperar até que alguns segmentos sociais despertassem para as possibilidades e a importância da política de Segurança Pública como bem público e como suporte essencial ao Estado Democrático de Direito.

Considerando-se a centralidade da questão cultural, portanto, torna-se claro o papel relevante a ser atribuído aos policiais enquanto sujeitos concretos, principais protagonistas dessa política. É útil, aqui, abrir um parêntese para que se chegue a uma melhor compreensão do que representa a polícia num contexto democrático, evocando o que diz Hermano Valencia Villa (2003), ao definir a polícia como uma

(...) atividade administrativa do Estado para a guarda da ordem pública e a proteção das liberdades fundamentais. A denominação polícia deriva do grego polis, que significa cidade ou Estado e pertence, portanto, a mesma família que política e político. Na tradição constitucional ocidental, a polícia forma parte das tarefas do governo ou executivo e não é uma função militar senão civil, por isso está totalmente regulada por lei e não admite tratamentos de exceção ou improviso (emergência). Por esta razão, nos países democráticos a polícia só estar adstrita ao governo civil, enquanto que nos países autoritários forma parte das forças militares. Por sua enorme influência na prática cotidiana dos Direitos Humanos da população civil, a função da polícia tem importância estratégia para a gestão democrática nas sociedades contemporâneas (VILLA, 2003, p. 351).

Pode se dizer que características acima atribuídas à polícia numa sociedade democrática não foram incluídas no pensamento dos constituintes brasileiros, já que estes não contemplaram a necessidade de adequar as polícias do país, sobretudo a Polícia Militar, à nova ordem política. Prova disto é que as polícias estaduais foram mantidas militarizadas. Ademais, vale observar que a vinculação dessa polícia às Forças Armadas antecede a ditadura militar, ou seja, a consolidação formal da vinculação das polícias estaduais ao Exército data da Constituição Federal Brasileira de 1946, quando o país já se encontrava num contexto democratizante, após a queda da ditadura do Estado Novo. Tomando como preocupação a cultura que permeia a política de Segurança Pública, esse dado ganha importância, pois denota uma compreensão de Segurança Pública antidemocrática que vem de longe, indicando que a concepção autoritária atravessa, de certo modo, toda a sociedade. Confirma-se, portanto, que o processo de mudança de uma política pública envolve mudança cultural profunda, muito além do que se possa imaginar à primeira vista.

Após essa reflexão que remete à complexidade do processo de mudança da Segurança Pública brasileira, recorre-se, novamente, às afirmações de Lynn Hunt, de que a mudança de cultura

(...) ocorre porque muitos indivíduos tiveram experiências semelhantes, não porque todos habitassem o mesmo contexto social, mas porque, por meio de suas interações entre si com suas leituras e visões, eles realmente criaram um novo contexto social. Em suma, estou insistindo que qualquer relato de mudanças históricas deve no fim das contas explicar a alteração das mentes individuais (HUNT, 2009, p.33).

Nesta perspectiva, tomando de empréstimo o pensamento da autora, entende-se que o alcance da democratização da Segurança Pública está a depender da construção social de novos sentimentos e pensamentos, associados ao Estado Democrático de Direito e à cultura dos Direitos Humanos. Em outros termos, como sugere O'Donnel (1988), é necessária a elaboração de pensamentos democráticos que impulsionem a práticas sociais democráticas, indispensáveis para a Segurança Pública num Estado Democrático de Direito.

No caso da Paraíba, especificamente, as mudanças indicadas pelo SUSP com vistas à democratização da Segurança Pública, a partir da inclusão dessas práticas, especialmente com a implantação do Policiamento Comunitário e outras práticas preventivas, têm sido precárias em virtude das limitações já apontadas e ainda persistentes no modo de sentir e de pensar dos policiais, embora tudo faça crer que esse problema não se restringe aos policiais.

Roberto Martins Ferreira (2005, p. 94), ao analisar a cultura da organização militar, no caso específico do Exército brasileiro, diz que a "adoção da retórica anticomunista por parte da organização militar cria um processo de retroalimentação. Ela garante a coesão da organização militar e ao mesmo tempo a projeta para a cena política", fazendo com que, nesse contexto, a resposta repressiva aos comunistas, vistos como "inimigos internos", seja bem aceita pelos membros dessa instituição por se coadunar com os seus valores. Nesse sentido, compreende-se que as mudanças propostas apontadas pelo SUSP, perpassadas por um viés democrático e de garantia dos Direitos Humanos, não sejam facilmente assimiláveis pela cultura das instituições militarizadas como as Polícias Militares. Assim como a guerra se coaduna com a cultura do exército, a cultura da Segurança Pública repressiva está associada à identidade da Polícia Militar. Logo, não há que estranhar as resistências ao novo, ou pelo menos um sentimento de ambigüidade até que se concretize um verdadeiro "ritual de passagem" do velho para o novo modelo de Segurança Pública.

Neste sentido, segundo o depoimento de policial militar da Paraíba, a dificuldade de mudança das mentes dos policiais em direção à aceitação da prática preventiva de cunho democrático deve ser vista, sim, como um dado real e relevante, principalmente por ser a percepção de quem vive o cotidiano da instituição. Esse fato não exclui, porém, a possibilidade de mudança, desde que haja a determinação do governo:

(...) os governantes tivessem esse conhecimento de que seria importante algo relacionado à polícia comunitária (...) porque ele jogava lá pro seu comandante de polícia, pro seu comandante de polícia buscar conhecimento, estudar, ver que isso é uma realidade possível e eficaz. Ele começar distribuir para os seus subordinados, seus comandantes de setores, de cidades, olhe vamos trabalhar nesse projeto de filosofia (...), então isso aí teria uma doutrina na corporação (ENTREVISTADO P, PRAÇA).

Outro depoimento, que se associa ao anterior diz: "se o gestor determina certamente alguém em baixo vai ter que cumprir. [...] Então eu diria que é preciso capacitar justamente esses gestores para ter em mente a possibilidade de viabilizar e estabelecer essas parcerias como algo normal" (ENTREVISTADO L, OFICIAL).

Nas declarações dos policiais fica demonstrado que acreditam em saídas para democratização da segurança pública via medidas autoritárias, portanto, ao mesmo tempo em que expressam o desejo de mudança do modo de fazer segurança pública, esses depoimentos também explicitam como a cultura autoritária encontra-se amalgamada no modo de pensar dos servidores públicos, encarregados pela construção da ordem democrática, nos termos de Villa (2003), conforme visto no capítulo I. Por outro lado, as declarações explicitadas acima podem ser sinalizadoras da tensão existente entre o modo de sentir, pensar e agir dos que fazem a segurança pública, influenciada pelas diferentes concepções de segurança que dão sustentação ao velho e ao novo modelo de segurança.

Rolim (2006, p. 94) sugere que devem ainda ser consideradas outras dificuldades, como a possibilidade de que a opinião pública esteja influenciada por um desejo punitivo, em decorrência principalmente da não punição de crimes. No Brasil, têm-se constatado altos índices de homicídios, enquanto têm sido muito pequenos os índices de instauração de inquérito, e ínfimo o número de homicidas levados a julgamento. Esses fatos têm contribuído para um sentimento de medo e de indignação frente à impunidade que muitas vezes pode levar a população a apelar para a vingança, até no sentido de "fazer justiça pelas próprias mãos", por meios violentos, indo no sentido inverso ao de um processo de luta pela Segurança Pública voltada para garantia e respeito aos direitos, incluindo-se a punição legalmente devida dos criminosos. O mesmo autor mostra que esses fatos têm influenciado, cada vez mais, a cultura do imediatismo e da punição: "Parece evidente que, diante de pressões de toda ordem, do alarme ou da indignação pública provocados por crimes de larga repercussão, a polícia se incline quase naturalmente em direção a 'resultados imediatos'" (ROLIM, 2006, p. 94), rompendo, por vezes, o "limite que separa a polícia do criminoso", como diz um dos entrevistados nesta pesquisa. (ENTREVISTADO I, OFICAL)

Na mesma linha do que diz Rolim (2006), situa-se o depoimento de outro entrevistado: "o policial não veio de outro espaço, ele faz parte do meio social, nós fazemos parte deste espaço social que vivemos" (ENTREVISTADO C -PRAÇA).

Sem, de modo algum, querer justificar comportamentos antidemocráticos, mas ainda na tentativa de compreender os desafios à democratização da Segurança Pública, cabe lembrar o que Jessé de Souza (2004) denomina de gramática social da desigualdade, assim como o que se encontra em Chauí (2007) e Dagnino (2004), dentre outros autores, ao abordarem o tema autoritarismo social. Ou seja, a existência de uma naturalização inconsciente da desigualdade social - sem a qual o sistema capitalista dificilmente poderia sobreviver e desenvolver-se - que tem profundas conseqüências nas práticas concretas, inclusive no sentido contrário do que determinam as definições jurídicas e legais. Assim sendo, não se pode esquecer que os integrantes da Segurança Pública geralmente refletem e reproduzem, em sua mentalidade e em sua prática, os antagonismos, a hierarquização, os medos, os preconceitos, a cultura da superioridade e da inferioridade, a negação de direitos, assim como o suposto direito de alguns de recorrer à violência, que se encontram, clara ou ocultamente, disseminados em nossa sociedade e constantemente reforçados pela atuação das classes dominantes a cujos interesses materiais e políticos servem. Por essas razões, inclusive, só policiais que já passaram por algum processo de crítica dessa mentalidade são accessíveis para um diálogo em torno dessas questões.

Mas um dos depoimentos, colhidos nesta pesquisa, testemunha esse quadro de contradições e ambigüidades que perpassam o processo de mudanças da Segurança Pública e o desafio a ser enfrentado pelo policial na reelaboração do seu modo de pensar e de fazer, em direção à reversão da cultura tradicional para a cultura democrática. Esse depoimento indica a ambigüidade em que vivem os policiais que, vislumbram individualmente a validade das expectativas de mudanças indicadas na nova ordem político-jurídica, - mentalizando o discurso dos Direitos Humanos e a figura do Estado de Democrático de Direito -, enquanto valores do passado ainda persistem em suas mentes, reforçados pela tendência da instituição de reger-se preferencialmente por valores da velha cultura policial, autoritária, discriminatória, voltada ao tratamento desigual e injusto:

Então a atividade policial é muito difícil (...) agora, quando o policial passa a ter conhecimento dos direitos do cidadão, quais são os deveres dele como policial, quais são suas obrigações, esse respeito aos Direitos Humanos, ele vai caminhar bem. A lei diz que o uso desproporcional da força vai incidir em abuso, ao efetuar uma prisão você tem que usar da força necessária, e essa força necessária ela é subjetiva, a lei diz que se você porventura matar alguém em legitima defesa é um excludente da criminalidade. (ENTREVISTADO E, PRAÇA)

Por outro lado, considere-se que a valorização de uma determinada cultura depende de como "alguma coisa é classificada em termos de desejabilidade social", como mostra Johnson (1997, p. 247). Há, certamente, da parte dos que fazem a instituição policial militar a preocupação em manter sua desejabilidade social ou de garantir sua legitimidade e seu próprio status social frente à sociedade em geral, segundo o que acreditam ser os desejos dessa sociedade, como está implícito no depoimento a seguir:

(...) o que ocorreu foi um esquecimento em relação à prevenção, a polícia militar ela perdeu o sentido de prevenção, é altamente repressiva porque dá mais resultado de promoção pessoal, dos comandantes que sai na mídia, que é o que a gente vê hoje, é melhor sair na mídia com um marginal, mesmo que não resolva o problema do local. (ENTREVISTADO H, PRAÇA)

Como sinaliza Roberto Martins Ferreira (2005, p.14), a organização militar tende a ser representada como uma "entidade ora dotada de autonomia absoluta, ora totalmente, subordinada", ora demonstra atender a seus próprios desígnios, ora volta-se ao atendimento dos interesses das classes dominantes. Assim, apesar de manter-se historicamente afastada da sociedade, quando lhe convém procura fazer-se presente na sociedade com vistas à realimentação do que Johnson (1997) chama de desejabilidade social, entendendo que para isso depende, preferencialmente, dos meios de comunicação. Conforme o depoimento acima, parece haver um "pacto" conservador entre a polícia e a mídia que é, sem dúvida, um instrumento social relevante no processo de permanência ou de mudança cultural. Ressalve-se, entretanto, o relevante papel que tem sido prestado pela mídia, em alguns casos, na denúncia de violações de Direitos Humanos praticada pela polícia.

Segundo uma pesquisa realizada junto aos repórteres policiais paraibanos, em 1997, a violência constitui-se numa mercadoria valiosa para as empresas de comunicação, a ponto de que quanto mais anormal a violência noticiada, maior o retorno econômico para os órgãos de comunicação (DIAS, 1997, s/n). Seria esta uma das razões pelas quais a cultura da violência, tanto de criminosos comuns quanto da polícia, encontra freqüentemente espaço preferencial na mídia, através de um enfoque sensacionalista, com o objetivo de provocar a curiosidade do consumidor da notícia, ao invés de privilegiar-se a discussão das causas da violência e da criminalidade de modo que suscite novas formas de equacionar o problema.

Outro dado da cultura tradicional da Segurança Pública, a ser pontuado, diz respeito à centralização de poder. Um dos entrevistados diz que "ele [o superior] não tem satisfação a dar à sociedade, à comunidade, principalmente àquelas mais carentes que sofrem com a ausência do Estado, não só na segurança, na saúde, educação" (Entrevistado J, PRAÇA). Quando se trata da necessidade de legitimação de seu poder, os responsáveis tendem a comportar-se dentro do modelo tradicional de fazer segurança, apoiando-se em determinadas ações policiais consideradas como sucesso. Cite-se o exemplo da exibição insistente, na mídia, do infrator que foi detido, preferencialmente pobre. A esse fim também serve a estratégia da visibilidade de policiais nas ruas, para gerar a sensação de segurança na sociedade, mas a simples ostentação de poder e força pode gerar na população uma sensação de segurança apenas ilusória, assim como diz um entrevistado:

Você pode ter uma cidade com a sensação de segurança alta e o índice de crime e violência também lá em cima, você pode ter uma cidade com índice de criminalidade e violência baixa, e a sensação de segurança alta. Uma lâmpada queimada num poste é uma situação que gera insegurança pública, embora não tenha nenhuma relação com a atividade da polícia, está relacionado com a atividade de outro estamento do poder público, que não é a polícia (ENTREVISTADO I, OFICAL).

Entende-se, portanto, que toda tentativa de aproximar a polícia da cidadania é viável, mesmo colocar policiais nas ruas, desde que estejam preparados para ação repressiva qualificada, como propõe a nova política de Segurança Pública, mas não basta restringir os esforços a essa prática do policiamento ostensivo. Mesquita Neto (2003, p. 216) registra que estudos realizados nas décadas de 1970 e 1980 já indicavam que estratégias tradicionais usadas pela polícia ostensiva, tais como o aumento da presença de policiais nas ruas, operações de patrulhamento, aumento do número de prisões, incluindo ainda a rapidez no atendimento às ocorrências, mostravam-se limitadas quanto à "prevenção ao crime e à violência".

A Polícia Militar caracterizada como ostensiva, pelo fato de ser fardada, com grande visibilidade pública e com maior proximidade da sociedade, tende a ser vista como polícia preventiva. Essa compreensão de prevenção associa-se ao direito penal que atribui caráter preventivo à função intimidativa ou coercitiva da pena. Segundo esta perspectiva, a própria existência da tipificação do crime, ou da lei penal, tende a ser considerada como medida preventiva (RICARDO, 2004).

Segundo um conceito mais avançado de prevenção no campo da Segurança Pública, esta implica algo muito mais complexo e requer intervenções efetivas direcionadas para esse fim, não devendo ficar restrita a associações subjetivas, sobretudo tratando-se de realidade social com as características brasileiras, em que a gravidade do quadro da violência e da criminalidade envolve múltiplos fatores de natureza diversificada.

Com efeito, uma nova forma de pensar e fazer Segurança Pública, que remeta a uma mudança cultural das polícias, sobretudo a militar, que tem o papel constitucional de fazer segurança ostensiva, passa pela desconstrução da noção de Segurança Pública como fator de garantia de uma ordem autoritária. Uma mudança efetiva fica, pois, a depender do processo de reelaboração mental voltada para a compreensão da política pública de segurança como garantia efetiva de direitos de todos, em consonância ao que já é socialmente evocado e desejado: o Estado Democrático de Direito.

Contudo, assim como as instituições policiais não devem ser compreendidas de forma separada da sociedade, esse processo de resignificação da política de Segurança Pública também não se dará de forma dissociada da dinâmica da sociedade. Isso significa dizer que os aspectos culturais não devem ser tomados de forma desarticulada da realidade concreta, fora das "relações e situações sociais" como sugere Coutinho (2000, p. 22) quando recorre a Agnes Heller, para defender que valor deve ser visto como "expressão subjetiva de um fenômeno primariamente objetivo".

Entende-se que o mesmo se aplica à questão cultural, que se processa como uma reprodução de aspectos objetivos e subjetivos, sobretudo quando entendida como o modo de sentir, pensar e agir de um povo. Logo, a depender da mudança ou reelaboração cultural de um determinado grupo de profissionais vislumbrando mudança de sua prática social, devem também ser levadas em consideração as condições objetivas que se devem processar na sociedade com vistas a impulsionar essa reelaboração.

Nesse aspecto deve ser lembrado que o modelo tradicional de Segurança Pública, assim como os valores antidemocráticos que sempre lhe serviram de sustentação e a noção de direito à segurança restrita à salvaguarda do patrimônio, sempre estiveram vinculados aos interesses das classes dominantes que, historicamente, mantiveram a política de Segurança Pública, no Brasil, como instrumento de satisfação de seus privilégios.

Assim, cabe lembrar que embora haja certa conquista das classes dominadas com relação ao desenho de uma nova política nacional de segurança, - chegando a sinalizar a reversão da história de apropriação dessa política pelas classes dominantes, sobretudo ao incluir os múltiplos sujeitos de direito, ao ampliar o objeto de intervenção, e ao rever os seus objetivos, em consonância com os princípios democráticos -, só se alcançará efetivamente a implementação dessa política se houver o fortalecimento da Sociedade Civil identificada com essa modalidade de política pública e o avanço social em termos de justiça econômica e de controle dos abusos de poder econômico, político e midiático.

Sem o fortalecimento do exercício democratizante da sociedade em torno da Segurança Pública dificilmente se alcançará a mudança cultural necessária dos que a fazem e muito menos a efetivação, nos Estados, de uma política pública que contemple as necessidades reais de segurança daqueles que sempre estiveram fora do alcance dessa política.

Notas

1. A expressão coronelismo é originária do título atribuído ao comandante local da Guarda Nacional, nomeado sempre dentre os economicamente mais poderosos. A representação social do coronelismo vinculada à atividade política, como a define Leal (1976), teria sido criada na região Nordeste em virtude do sistema de domínio político centralizado pela figura do grande proprietário de terras, que controla o poder político local, pelo seu domínio, violento ou clientelístico, sobre os eleitores e sem distinção entre interesses públicos e interesses privados.

2. Segundo Carvalho (1998, p. 134), o clientelismo perpassa toda a história política do país. Ele "indica um tipo de relação entre atores políticos que envolve concessão de benefícios públicos, na forma de empregos, vantagens fiscais, isenções, em troca de apoio político, sobretudo na forma de voto".

3. Para o mencionado autor essa esfera é constituída pelos novos órgãos púbicos de promoção dos direitos do cidadão, criados a partir das inovações adotadas na Constituição Federal de 1988 (LYRA, 1996).

4. Criada pela Resolução 25/90 do Conselho Universitário - CONSUNI, da UFPB.

5. O referido órgão foi criado pela Lei nº 5.551, de 14 de janeiro de 1992. Segundo Lyra (1996), o fato de incluir os direitos dos homens e do cidadão na sua denominação dá maior amplitude à sua atuação, uma vez que se ocupa dos Direitos Humanos, mas também dos direitos do cidadão, isto é, além das "violações em geral relacionadas com a violência, de caráter individual, de grupos ou de etnia, ou social", também, se preocupa com os direitos fundamentais da pessoa humana" (Lyra, 1996, p. 34).

6. O Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos foi criado através da Resolução 06\2006 do Conselho Universitário - CONSUNI, sendo inaugurado em setembro de 2007. A sua criação decorreu principalmente da necessidade de fortalecimento das atividades acadêmicas na área de direitos humanos na UFPB, mediante a articulação do ensino-pesquisa e extensão. Com a sua instituição a prática em direitos humanos ganhou maior autonomia em razão de ser-lhe permitido pelas normas da Universidade a promoção de cursos de pós-graduação. Ao ser preservada a permanência da Comissão de Direitos Humanos, coube a esta, prioritariamente a intervenção de caráter político-social, em casos de violações de direitos humanos.

7. O Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares (GAJOP), entidade da sociedade civil de promoção e defesa dos Direitos Humanos, com Status Consultivo Especial no Conselho Econômico e Social (ECOSOC) da ONU, tem atuação especializada na área de justiça e segurança com abrangência nacional. Sua missão institucional é contribuir para a democratização e o fortalecimento da Sociedade e do Estado, na perspectiva da vivência da cidadania plena e da indivisibilidade dos Direitos Humanos.

8. Embora anunciados como princípios, no texto a seguir são descritos como diretrizes gerais.

9. Ver programas no anexo 4.

10. Luiz Couto reafirma denúncia do uso de viaturas oficiais na campanha de Cássio, UniBlog, 13 outubro, 2006.

11. Professor universitário, vinculado ao Partido dos Trabalhadores, foi relator da Comissão Parlamentar de Inquérito - CPI, para investigar ações criminosas de milícias e grupos e extermínio no Nordeste, atualmente presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal.

12. O referido Sub-Secretário, hoje vereador de João Pessoa, participou como aluno do curso de Gestão em Policiamento Comunitário, promovidos pela CDH e PRAC\UFPB.

13. Os membros da CDH/UFPB, que participaram inicialmente das discussões apenas por seu compromisso político e social, não continuaram no projeto, saindo antes de sua implantação, por divergência teórico­metodológica e política com a forma de condução dos trabalhos.

14. O referido bairro apresentava um contingente populacional de 65.000 habitantes.

15. Jornal Folha de São Paulo, Polícia joga novas bombas contra manifestantes da USP; protesto pede retirada da PM. 09/06/2009.